sexta-feira, agosto 05, 2005

Viagem à aurora do mundo



São dez e quinze, vou ficar mais um pouco e depois vou dormir... o dia foi meio pro chato hoje... é bom que termine logo, e termine com uma boa cama, coberta quente e um livro. Antes, seriam horas de leitura e minutos de sono, hoje, felizmente, acho eu, é o inverso. Isso é bom.

Mas, bom, bom mesmo, agora, seria calçar a botina sem meia, pegar a lanterna e ir ao curral ver as vacas, sentir o friozinho da noite, ver estrelas sonhando com nuvens de chuva, fechadas e escuras... ficar desejando a chegada da chuva pra encharcar a terra, dessedentar as plantas, deixar o areião batido e gostoso de andar.

Enquanto as nuvens negras e benfazejas, ao contrário do que se diz das nuvens negras, não chegam, olho o céu, tantas estrelas, uma cadente, demorada até, devia ser grande a danada, queimou bastante, rastro luminoso no céu. Faço um desejo, sempre o mesmo velho desejo, agora com variações. Mas a essência do desejo não muda, quero mais do mesmo. A fazenda, ou o sítio melhorado, ampliado. Mais vacas e bezerros pastando indolentes, deitando pra ruminar. Cavalos brincando, sempre alertas, atentos a tudo, ainda crentes lá no fundo de seus cérebros que a qualquer momento um poderoso tigre-dente-de-sabre vai aparecer do nada e ataca-los.

Em infinitos lugares por esse universo para o qual olho, a luz que refletimos há muitos milhares ou muitos milhões de anos, está chegando somente agora. Talvez alguém por lá tenha inventado a máquina da viagem à aurora do mundo, a máquina que ia buscar na luz distante refletida da Terra, as cenas de quando tudo começou. Curioso esse pensamento, nele se misturam todos os prazeres, todos os sonhos e mistérios. Estrelas... o passado... a terra... Então, quem sabe, enquanto estou aqui a sonhar, olhando os cavalos e imaginando como era tudo quando os tigres-dente-de-sabre passeavam por aqui, os cavalos pastando calmamente, levantando as cabeças, movendo as orelhas, ao som de qualquer folha mais barulhenta farfalhando, talvez alguém tão distante esteja enxergando meu sonho num passado remoto, onde os cavalos pastam e os tigres caçam, mas eu não estou presente, eu nada sou, apenas uma projeção do futuro voltando no tempo e no espaço, acompanhado do futuro de muito, muito longe.

Para Erico Veríssimo. Seu “Viagem à aurora do mundo” me marcou para sempre, mesmo lido uma só vez, ainda guri de tudo.

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6 comentários:

Anônimo disse...

Sinto pena de mim toda vez que alguém cita entusiasmado um livro que (ainda) não li. De Veríssimo, além da famosa trilogia, apenas "Clarissa", "Música ao longe", "Caminhos Cruzados" e alguns contos.

Esse texto seu já valeu o dia. Os outros, como sempre, execelentes também.

Bom findi. :)

Emerson disse...

Oi Ana.

Não sei se "Viagem..." seria um livro para uma releitura, no meu caso , ou uma primeira leitura, no teu. Ele me marcou por te-lo lido na infância e por ter feito minha imaginação voar longe. Hoje? Sei não...

:o)

Emerson disse...

Além disso, "Viagem..." é uma obra considerada como infanto-juvenil.

:o)

Lila Rossi disse...

Ah! Meu amigo! Eu também me lembro das tardes, depois da escola. Horas de leitura até o jantar. Na poltrona vermelha, costas num braço, pernas pendentes no outro e a imaginação a vagar, presa nessa "Viagem" de Veríssimo.

Antonio disse...

Li "Viagem à Aurora do Mundo" duas vezes quando ainda era criança. É um livro de ficção científica, brasileiro, que merecia ser filmado. Tem romance, fantasma, sci-fi, é educativo. Está esgotado nas livrarias. Se fosse na França...

Túlio disse...

Olá Emerson!
Olha, eu lá reli o livro Viagem a Aurora do Mundo várias vezes e estou relendo-o ainda hoje.
É o meu livro predileto. Tenho 64 anos e não me canso de reler. Pelo menos uma vez por ano. Por quê? Sei lá, adoro arqueologia, dinossauros, paleontologia em geral. Quando vou ao mato fico rebuscando pedras, ver se acho algum fóssil. Até hoje nunca encontrei um sequer. Não tem importância - se eu reler o livro citado.
Sorte a sua que tem a sua fazenda. Conserve.
Grande abraço.
Túlio