domingo, fevereiro 15, 2009

Granja Viana, adeus



Chove.
Chove tanto e há tantos dias que o solo do gramado virou uma esponja: apertado pelo pé, esguicha água por toda parte e barro em algumas. Tanto isso é verdadeiro que fez com que meu filho desmarcasse sua festa de aniversário e despedida da Granja Viana.

Despedida, sim. Essa manhã chuvosa de domingo é a última que vivo aqui, nessa casa que há 15 anos é o meu lar.

Nesse período, como não poderia deixar de ser, dramas, tristeza, alegrias e conquistas aconteceram. Choramos e rimos, nada diferente do que acontece ao longo de 15 anos em qualquer lar.

A Granja mudou.


Nós também mudamos
, claro, mas a Granja mudou, foi mudada, muito mais que nós.
Há menos árvores e muito mais casas.
Os carros multiplicaram-se em espantosa progressão geométrica.
As ruas simplesmente não cresceram, sequer na largura, exceção feita a um ou outro trecho pequeno.

Os saguis não vêm mais até aqui, em busca de insetos e frutinhos nas árvores, além das fatias de mamão e das bananas que o Marcelo e o Renato, nossos vizinhos, e nós mesmos, colocávamos para eles nas árvores próximas.


A própria chegada deles pegou-nos de surpresa há alguns anos e foi o sinal, como disse para os rapazes e para a Rosa, que a Granja estava acabando.


Eles estavam aqui porque pedaços do seu velho habitat estavam destruídos.

Agora a destruição encostou aqui em casa.
Não há o que fazer, é tudo dentro da lei.
Não há o que fazer, é tudo fruto do progresso.

Impotente, deixo a Granja com alegria.

Quem vem para cá irá gostar.
Sim, irá gostar, pois essa Granja de hoje ainda é muito melhor e mais gostosa que qualquer bairro paulistano. Principalmente os bairros verticais, onde as pessoas vivem embaixo ou em cima e ao lado umas das outras, separadas por centímetros de concreto, alguns quadros e carpetes.

Para mim, contudo, é tempo de mudar.
Soa como uma derrota, não deixa de ser.

Sempre soube que a Granja era passageira e sempre soube que as árvores e os animais, como os mutuns e os serelepes, tinham pouco tempo pela frente.

Esperava estar longe quando essas mudanças começassem, mas fui atropelado por elas.

Vou para o sítio, para onde sempre quis ir, para onde sempre soube que um dia ainda iria. Felizmente, vou a tempo de trabalhar, de começar de verdade, para valer, um novo trabalho, um novo ciclo em minha vida.

Lamento pela Granja e por seus moradores não humanos. Para os humanos, para a maior parte deles, ela está cada vez melhor. A estrutura de serviços é fantástica, cobre tudo, do pequeno, acolhedor e providencial Armazém do Nicolau ao grande Wal-Mart, passando por livrarias, restaurantes excelentes, o melhor deles ainda sendo o Ney e seu Pátio Viana, que o que não tem chic tem gostoso, pizzarias, lojas de informática, mercados como o Pão de Açúcar e o Marché, refinados e tentadores, até o Habib’s e o McDonalds.

A Granja é uma festa e em nada mais precisa de São Paulo, sequer escolas, até a universidade. O que é ótimo, porque a Raposo Tavares continua o gargalo, pior a cada nova temporada escolar. É o progresso.

É, não consegui esconder um laivo de tristeza nessas
palavras, mas, podem acreditar, é por tudo que a Granja foi e está deixando de ser. Um lugar de matas e bichos com um monte de casas espalhadas.

Desejo que as novas pessoas que farão dessa casa um
novo lar sejam felizes.
Espero que cuidem dos três ipês juntinhos, fazendo um só, todos amarelos, florescendo um depois do outro e colorindo a frente da casa por muitas semanas do meio do inverno.
E também do pé de acerola, que tanto suco já nos rendeu.

Que essa chuva seja somente a água que está lavando tudo e criando um novo espaço para os novos moradores.
É tempo de mudanças, para todos nós.
Que elas nos tragam mais felicidade e alegrias.

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domingo, fevereiro 08, 2009

Fevereiro, mês de estrada destruída


É tanta coisa que não sei por onde começar.

Vou começar pelo fato de estarmos em mais um fevereiro, evento que se repete todo ano, como bem sabe qualquer pessoa com mais de três ou quatro anos de idade.

Eu disse qualquer pessoa?

Triste engano, políticos são pessoas, mas ignoram esse fato básico que até as folhinhas registram.

Há quatro anos, a passagem da nossa estrada vicinal que liga Santa Rita do Passa Quatro à Santa Cruz da Estrela, sobre o Córrego da Estrela, foi destruída por uma chuva fortíssima. Para quem quiser ver o que aconteceu e o que escrevi, tem um post a respeito: “Carnaval no campo e na roça I”. Foi postado em 9 de fevereiro de 2005 e tem duas sequências.

No ano seguinte, em fevereiro, foi a vez do córrego do Zé da Silva. O bueirão entupiu, como é obvio que aconteça todo ano, a água acumulou-se na baixada, transformando brejo e um pedaço de pasto em enorme lagoa, até que, como sói acontecer desde que o mundo é mundo, a pressão da água venceu a força do aterro sobre o qual passa a estrada e... Lá se foi a estrada. A pouco mais de dois mil metros do desastre anterior.

Depois disso tivemos dois fevereiros sem desastres, não por méritos “prefeiturísticos”., mas por mera sorte. Aqui pertinho da porteira, a uns mil e poucos metros, a água do Rio Clarinho cobriu a estrada, mas o aterro, sabe-se lá por que, resistiu e não ruiu.

Neste fevereiro o desastre voltou, dessa vez no Córrego do Padre, a meio caminho entre este Sítio das Macaúbas e a cidade de Santa Rita do Passa Quatro. A água acumulou, forçou e venceu o aterro. Criou um buraco com quase 14 metros de profundidade.

A força foi tão tremenda que levou de cambulhão pedaços de lajes de concreto pesando toneladas, e torceu e retorceu os tubulões de ferro como se fossem de papel, arrastando-os para longe, também.

A água depositou toneladas e toneladas de areia sobre o pasto do sítio do Mauro e da Pirina, pais do Zé Roberto, que está sempre aqui no sítio para mochar os bezerros e uma coisa ou outra. Eu não vi, mas um amigo contou-me dos dois, olhando o sítio, e chorando.

Por que isso aconteceu?

Porque choveu demais, uma pancada brutal que despejou cerca de 130 mm em uma hora, como soi acontecer em todo fevereiro. Tanta água em tão pouco tempo, deparando com o bueirão entupido, acumulou-se...

O detalhe é que, poucos dias antes disso, o Mauro procurou a prefeitura e disse que o bueiro estava entupido.

Pois é.

Mas, vamos e venhamos, nem era o caso dele falar, certo?

Porque, o certo, o lógico, o razoável, o correto, o honesto, em suma, seria que esses bueiros, esses tubulões, fossem inspecionados regularmente e, claro, fossem limpos periodicamente, digamos, uma vez por ano. Entre Santa Rita e a Estrela, a distância é de 17 quilômetros. Nesse trecho, a estrada passa sobre o Córrego do Rola-Abóbora, depois sobre esse Córrego do Padre, aí vem o Rio Clarinho, seguido pela passagem sobre o Rio Claro, a poucos metros da nossa divisa de baixo; segue-se o córrego que vem da fazenda do Zé da Silva e, finalmente, o Córrego da Estrela.

Aí pergunto: quanto tempo e quanto dinheiro custariam essas inspeções e o envio de uma turma de manutenção, para simplesmente limpar os tubulões? Tirar os galhos que se acumulam e o excesso de areia que fica retida nas entradas dos bueiros? Praticamente nada, menos de um dia de serviço em cada um e custo quase zero para os cofres municipais.

Mas... Já tivemos três desastres e outro que só não aconteceu por sorte.


Daqui a doze meses será fevereiro novamente. Ou melhor, digo, ou pior, ainda estamos em fevereiro, o Carnaval está por chegar, e as grandes chuvas têm particular apego pelos desfiles e fantasias. Nada impede, muito menos a prefeitura desse município, que um novo chuvão brabo destrua mais um trecho de estrada.

Cada vez que isso acontece, centenas de pessoas são profundamente afetadas em suas vidas. Agora, por exemplo, enquanto a prefeitura não providencia uma passagem de emergência, as crianças estão levantando de suas camas às quatro horas da manhã, pois o trajeto para a cidade foi aumentado, subitamente, em mais de vinte quilômetros, a maior parte por estradas de terra. Ou em mais de quarenta, se pegar só asfalto. Sem falar em ambulâncias, caminhões transportando leite, laranja, mercadorias, ou nos ônibus intermunicipais, e por aí vai.

Pois é, tanta coisa pra falar, inclusive que, antes desse Carnaval chegar, estaremos aqui no sítio de mala e cuia, definitivamente.

Porque, antes desse Carnaval chegar, chegará nossa mudança.

Estamos deixando São Paulo e a Granja Viana para trás.

Santa Rita do Passa Quatro é nosso futuro, com a estrada destruída e sem receber pelo leite que entregamos, dia sim, dia não, para o laticínio Nilza.

Faz parte.