quinta-feira, agosto 25, 2005

Tristeza... A Velhinha se foi


O café-da-manhã de hoje não foi dos mais saborosos. Na verdade, nem lembro do que comi e bebi. Não bastasse meu espírito já meio predisposto a uma deprezinha depois do jogo de ontem à noite no Morumbi, tive o choque de ler a notícia da morte da Velhinha de Taubaté.

A Velhinha – Dona Velhinha pra rapaziada que não a conheceu no auge, faz favor – tem me acompanhado ao longo desses tempos turbulentos como um vôo São Paulo/Porto Alegre no inverno que vivemos na Terra de Vera Cruz.

Acho que sua morte encerra um ciclo. Lembro de quando ela surgiu no cenário nacional. A ditadura, que já não o era mais, esculhambada pela duração (já repararam como esculhambamos com tudo, até mesmo ditaduras?) e pela presença à sua frente de João Batista, general cujas maiores qualidades eram a paixão pelos cavalos e sua disposição em conversar com outra velhinha simpática, ainda que chatinha, a Salomé, “de Passo Fundo, tche!” O general, então cumprindo a missão passada por seus pares de comandar o governo e a república, prometia muita coisa. Democratizar o Brasil. Abrir o regime. Prender e arrebentar quem fosse contra tão nobres princípios. E outras coisas mais, coisas mais comezinhas, difíceis de serem lembradas depois de tanto tempo passado. O que importa, entretanto, é que ela acreditava no governo. Era um exemplo para um país de descrentes, muitos, talvez, até profissionais, como certos estudantes que viram avós e continuam estudando.

Ouvir suas doces palavras de fé e crença no governo brasileiro nos dava, reconheço eu o que ninguém jamais reconheceu, um certo alento. Sim, porquê a gente quer acreditar no bem, quer o melhor, mesmo quando estamos pregando o “quanto pior, melhor”. No fundo, no fundo, a gente quer acreditar em algumas coisas que os governos dizem. Que estão trabalhando para o nosso bem-estar e que seremos ricos e felizes e até mais bonitos. Eu que queria ter a cara, cabelos, corpo e etc do George Clooney ou do Sean Connery, e, principalmente, a ironia do Sean, sempre esperei por esse anúncio. Pena que nem Figueiredo ou Sarney, ou os Fernandos Afonso e Henrique e agora o Ignácio me prometeram isso. Ouvi em off que Tancredo iria prometer-me essa benesse, mas, coitado, foi-se antes de chegar e aqui permaneci, ainda sonhando com, pelo menos, a ironia. E parte dos dólares.

Temo pela jovem democracia tupiniquim. Hoje, mais que nunca, tenho profunda convicção que a verdadeira âncora de nossa estabilidade política não era o Toninho Palocci, e sim a Velhinha e sua fé inabalável no governo. Como bem lembrou Veríssimo, fé abalada várias vezes mas sempre recuperada. Disse ele que o caso mais grave foi por ocasião do episódio da compra de votos para a reeleição de Fernando Henrique, mas as explicações ouvidas – com certeza do próprio e acompanhado de Dona Ruth – deixaram-na satisfeita. Ela gostava do Professor-Presidente e sua prosa convincente.

Agora, ela morreu. Ela que tanto acreditava em Ignácio e Toninho Palocci. Não o disse Luiz Fernando, digo-o eu: ela também acreditava em José Dirceu, tanto que Zé passou a ser o nome do bichano, neto do famoso Carlos Átila dos tempos figueiredianos. Acreditem, sua crença far-nos-á muita falta. Aproveito para adiantar que notícias dizendo que Marcos Valério pagava suas contas de água, luz, telefone e tv a cabo são completamente infundadas. Nem ele, nem Dona Renilda.

Fechando, pesaroso, tudo que consigo lembrar e pensar é dos muros pichados em Paris, em 1968, com as palavras de ordem gritadas nas ruas por algumas correntes do amplo movimento estudantil que abalou a República, que abalou o mundo, que ajudou a criar tudo isso que ora vivemos:

Deus morreu. O Tempo morreu. E Eu mesmo não estou me sentindo muito bem.


P.s. em 1968 eu era só uma criança; o crédito por essas lembrançãs é de Julio Cortazar, em "Ultimo Round".

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Um comentário:

Anônimo disse...

Até que você é um cara antenado, sabia? Todos falam da morte da velhinha hoje. eem todos os jornais. Mandou bem.