domingo, dezembro 31, 2006

Perdas & Danos... Ou: Adeus, 2006


É assim que recordo esse ano prestes a terminar. Meio triste, meio chateado.

Talvez pela permanência de lulla da Silva por mais 4 anos.

Talvez pelo lento sentimento de inviabilidade que começa a ficar mais e mais palpável sempre que penso no país.

Talvez pelo absurdo da impunidade sobre tudo e todos.

Talvez eu esteja assim pela morte da família de Bragança, queimada viva em seu carro. E, agora, a morte de mais sete pessoas, queimadas vivas dentro de um ônibus no Rio de Janeiro. E a certeza de que os autores desses crimes tão bárbaros nada sofrerão. E, se condenados, não ficarão mais que doze, talvez quinze anos, numa prisão.

E, para agravar esse sentimento, teve a seca. A cruel seca de 2006 que pôs abaixo parte de meus sonhos. Por outro lado, é claro, trouxe lições. Mas as perdas e o sentimento de derrota estão difíceis de serem superados. Foram muito fortes; são, ainda.


Não é um bom final de ano, lamento.

Tento pensar em alguma coisa para justificar um novo título, algo como Perdas & Ganhos.

... Tentei, mas não cheguei a parte alguma. Claro, no plano pessoal mais próximo estamos todos bem, e isso já é muita coisa. As vacas estão bem, apesar dos pesares, o pasto de tanzânia está bem implantado, o canavial também, e essas foram duas conquistas, sem dúvida, aliadas a um controle razoável das águas das chuvas. Todavia, fica um sentimento de insuficiência, de faltar alguma coisa.

... O ano termina com uma demonstração inequívoca de como estou deslocado no mundo publicitário. Nesses últimos dias entrou um trabalho novo e um pouco diferente: escrever o roteiro para um vídeo já criado e entrando em fase de produção acelerada. Desde o primeiro contato telefônico, entretanto, senti que não era um trabalho para mim. Senti que não conseguiria escrever o que as pessoas esperavam.

E o que elas esperavam e estavam dispostas a pagar para ter?

Palavras de estímulo ao consumo de um serviço na área de saúde.

Queriam um vídeo vendedor.

Foi quando comecei a entrar em choque comigo mesmo. De um lado, a necessidade de trabalhar, abrir um novo mercado, fazendo algo que gosto e para o qual estou capacitado. De outro, porém, minha velha, minha antiga postura de repúdio a vender alguma coisa para alguém. E, para isso, usando palavras, dourando pílulas que sei não serem tão douradas. Coisa difícil demais. Já era difícil antes, ficou muito mais difícil agora.( Tal como escrever um texto otimista e positivo, hoje, sobre esse ano que finda. Não dá.)

Tive sorte: o cliente reclamou de todos os custos e acabei cortado de maneira nada elegante, mas faz parte, né?

No íntimo, gostei.

Isso já é alguma coisa: saber o que não quero, o que não gosto, o que me desagrada.

É sempre bom começar um novo ano com algumas certezas.

Então, é isso: que venha 2007.

Que venha com chuvas bem distribuídas.

Que não seja tão violento e cruel como foi 2006.

Que não seja tão sujo e criminoso nas cúpulas de poder espalhadas pelo Brasil como foi em 2006. A começar pelo poder maior, ancorado no Planalto.

Que venham as chuvas, e que venham bem distribuídas.

E que todos tenham muita saúde & paz em suas vidas, com chuvas abundantes, regulares, criadeiras, tanto figurativa como realmente.

Chuva é vida. Feliz 2007.

“Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.

Ambos existem; cada um como é.”

Fernando Pessoa (“Ficções do Interlúdio” – Poemas Completos de A. Caeiro)


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quinta-feira, dezembro 28, 2006

Premonição, exagero ou o começo?


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Forças armadas islâmicas abandonam capital da Somália

Com esse título, a página do Estadão na internet noticiou há pouco os últimos fatos do conflito armado entre forças legais somalis, apoiadas por unidades etíopes, e rebeldes muçulmanos.

O que me assusta é o começo da frase: “Forças armadas islâmicas...”

Acredito, infelizmente, que a evolução dos conflitos e dos diferentes ódios nos últimos 25 ou 30 anos entre muçulmanos e cristãos, árabes e judeus, colonizados e colonizadores, brancos e pretos, acabará conduzindo a algum tipo de conflagração ampla e brutal e, com certeza, global.

“Forças armadas islâmicas...” é uma expressão assustadora.

Recorda as Cruzadas.

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terça-feira, dezembro 26, 2006

Imagens natalinas no Sítio das Macaúbas

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Fim de tarde no dia 23 de dezembro. A cena parece, apesar da casinha meio cabocla, de uma fazenda do interior canadense em meados do outono... Talvez em Quebec, talvez em Ontario...


Não choveu nesse Natal. Só um pouco no dia 24 e na madrugada de 23 para 24, mas a terra já estava bem molhada pelas chuvas da semana.

O entardecer da véspera foi magnífico, o céu limpo depois de uma chuvinha gostosa e de um dia quente e abafado. Alguns bezerros sequer se deram ao trabalho de levantar e buscar o abrigo de uma árvore, e simplesmente ficaram deitados embaixo da chuva.


Aqui, as bezerras mais novas e um machinho entram no bezerreiro onde passarão a noite. A presença do fotógrafo, como de hábito, interfere e elas ficam curiosas.



As Jersey adultas e duas novilhas mais espertas, a Graciosa e a Estrela, pastam o tanzânia na ponta do pasto próxima do grande pé de manga-espada e da cabeceira da matinha da mina.



Harry Potter, filho da Feiticeira com o Safari, irmão da Maga...

Leva jeito de vir a ser um touro bonito.


Estou ansioso para ver como sua irmã inteira vai se sair como produtora de leite, pois a mãe é muito boa. Nesse caso, aumentam as chances dele vir a ser um bom reprodutor, ou seja, gerar filhas que também sejam boas produtoras.




Maga, Milu e Luna no pasto da parte de baixo do sítio.


Na verdade, trata-se, ainda, dos pomares de limão-taiti, tangerian ponkan e laranja-lima. Elas comem o capim que cresce nas ruas entre as linhas de árvores.


Na esquerda da foto, outras duas grandes mangueiras, também de espada. Elas escondem o bosque de jaboticabeiras antigas e enormes. Quando frutificam, dão jaboticabas enormes, deliciosas. Esse bosque, com quase vinte pés, já faz parte da mata há muitos e muitos anos.




No primeiro plano, os bezerros um pouco mais velhos, todos machos, no bezerreiro do barbatimão. Ao fundo, suas mães voltam do piquete para beber água.


Essas longas tardes de verão são muito bonitas. Isso, é claro, depois de uma boa chuvarada. Os insetos, como em qualquer outro lugar desse planeta azul, branco e marrom, com forte viés para mais marrom, perturbam. Mas, é assim que é e sem eles nada seria assim.


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sexta-feira, dezembro 22, 2006

Feliz Natal!




Ontem, às 22:20, começou o verão.

Mero formalismo, já que nos termômetros ele começou faz tempo.

Com o começo oficial do verão o ano termina. Antes dessa passagem emblemática, porém, temos outra, que é a chegada do Natal.

Quando criança, era uma época mágica. Passávamos o ano inteiro à espera dessa data e tudo que se relaciona a ela: castanhas, nozes, panetones e presentes. A vida era simples na nossa ótica infantil, e mais simples ainda naqueles tempos distantes em que internet, por exemplo, não existia nem na ficção cientifica. Computador era chamado de cérebro eletrônico e também não existia, era coisa de livrinho de ficção científica. Sim, telefone já existia, por favor, né? Mas eram poucos e privilégios das boas casas comerciais e das famílias da elite econômica ou social (todo mundo sabe que essas elites nem sempre coabitam), sem falar que uma ligação para outra cidade era feita via telefonista. No decorrer de meados dos 70, impressionei-me com uma matéria em revista científica, dizendo que, caso o sistema telefônico americano ainda dependesse das telefonistas de outrora, sua operação precisaria de mais de 20 milhões de operators nos horários de pico. Santo computador!

O Natal tinha, também, aquele negócio bom de famílias reunidas e boas comidas, além de relativa abundância de refrigerantes. Lembro-me que sempre checava o estoque de vasilhames para guaraná e coca-cola, cuidando para que nenhum se quebrasse e reduzisse o abastecimento de tão preciosos líquidos.

Observação para as novas gerações: vasilhame era o nome dado às garrafas de qualquer coisa que precisavam voltar ao comércio e à indústria quando comprávamos novas unidades. hoje está voltando à moda e à prática do dia-a-dia em países pobres e atrasados, como a Alemanha. Nos países ricos e desenvolvidos, como é, felizmente, nosso caso, compramos tudo novo e jogamos tudo que é usado no lixo.

De volta ao Natal. Com o tempo, a gente cresce, vira adulto e aprende que Natal é mais que uma festa para ganhar presentes, comer e beber bem. Natal é confraternização, é boa vontade, é amor, é tudo isso que a gente vê nos anúncios e desejamos uns aos outros.

No que me diz respeito, desejo a todos vocês um


Feliz Natal, pleno de harmonia e amor.


E cheio de boas comidas, boas bebidas, boas risadas e também presentes,

dados de coração, quando todos são bons e belos.


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segunda-feira, dezembro 18, 2006

Cidade Limpa



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Essa história de que todo mundo gosta de viver num lugar bonito, atraente, gostoso de olhar, bem sinalizado, é balela. Pelo menos por aqui, nessa grande, pobre e feia megalópole. Já estamos acostumados a isso.

E, de tão acostumados, nem demos muita bola para uma medida proposta pela prefeitura e aprovada – inacreditavelmente, acreditem – pela Câmara Municipal dessa cidade. Medida simples, que surpreendeu-me ao ponto de não acreditar no que lia. Era a lei Cidade Limpa, que combate a poluição visual na cidade e obriga a retirada de todo tipo de anúncio externo na cidade a partir do próximo 1º de janeiro. E os anúncios de fachadas – fatídicos, horríveis, agressivos, chatos – terão de ser enquadrados aos ditames da lei até 31 de março.

Coisa de primeiro mundo. Que digo? – coisa de primeiríssimo mundo. Uma das raras medidas inteligentes, justas, visando ao bem comum dos cidadãos e não ao bem comum de meia dúzia.

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Tarde de sábado, estou numa loja pensativo, gastando neurônios com a questão comprar ou não comprar. O dono da loja, que também é dono da loma do outro lado da rua, conversa com alguém que me parece ser o gerente dessa unidade, que está contando da visita de um fiscal da prefeitura.

- Ah, é, o fiscal passou por aqui, é?

- Veio falar da placa da fachada. Com a nova lei a gente vai ter que mudar o tamanho dela.

- Pombas, esses caras não têm o que fazer e aí ficam inventando moda. Deviam era cuidar do que é importante, como combater as enchentes, e não ficar amolando quem está trabalhando. E aí, o que vamos ter que fazer.

- Jogar fora as placas atuais e trocar por outras, de acordo com o tamanho da fachada. Ele deixou as medidas aqui... Dá uma olhada.

Enquanto olhava as medidas marcadas no papel, o dono da loja resmungava e xingava, do prefeito ao presidente, que, por sinal, nada tem a ver com esse caso. E o gerente da loja em que eu estava contou do impacto que a lei provocou, tão grande que até o New York Times publicou uma matéria a respeito.

- Vamos ter que aprontar tudo até o dia 1º agora?

- Não, a gente tem até o dia 31 de março pra fazer a troca, sem multa.

- Essa multa é muito alta, um absurdo.

...

- Até 31 de março a gente não é multado, mesmo deixando a placa?

- É isso.

- Então vamos deixar até o dia 31. Antes disso a gente derruba essa palhaçada, você vai ver só. Essa lei vai ter vida curta, vamos ver quem é que vence essa parada, com ou sem o New York Times ficar falando abobrinha.

Bom, diante de tamanho desprendimento cívico desisti da minha compra. Recoloquei o livro na estante e fui embora.

Ah, é mesmo, eu estava numa livraria, num sebo, pra ser mais preciso. E o cidadão com tão alto espírito cívico tratava-se do dono de uma livraria, alguém, supostamente, ligado à cultura, à difusão do saber, um ser com alguma ligação, ainda que mínima, com a arte, com algum conhecimento de estética. Qual! Nada mais que outro troglodita tupiniquim.

O mais curioso é que suas lojas não precisam das placas enormes e feias que berram que ali se vende livros usados. Além das outras, anunciando que compram livros usados. Não precisa porque aquele trecho da avenida é conhecido por ser o trecho dos sebos. São 9 ou 10 lojas, uma quase colada à outra, facilitando o trabalho e reduzindo a queima de calorias de quem está à procura de livros de todo e qualquer tipo, dos raros aos baratinhos.

A reação desse livreiro é a mesma de outros milhares de comerciantes, sem falar nos donos de empresas de out-doors e agências de publicidade. Parece que uma empresa de out-door já conseguiu uma liminar garantindo a manutenção de seus monstrengos à beira da Marginal Pinheiros. E a Associação Comercial, zelosa e pressurosa em defender os direitos dos associados (pelo menos esses direitos, muito mais fáceis de serem defendidos do que os mais importantes), sem cobrar com a mesma força pelas contrapartidas aos direitos, vive em permanente atividade desde a aprovação da lei e anunciou que nos próximos dias entrará com medida judicial contra a implantação da lei. Diz a Associação que a cidade não pode ficar como está – oh, aleluia! -, mas que não pode aceitar o caráter proibitivo da lei.

Nessa altura do campeonato, temo por sua aprovação. Mas esse prefeito já se mostrou um bom brigador e com vontade de acertar. O problema será se a Justiça conceder a liminar e o processo arrastar-se por décadas, como sói acontecer. A cidade continuará emporcalhada e muito, muito feia.

Todavia, quem sabe?

Estou na torcida pelo prefeito e pela implantação da lei Cidade Limpa.

São Paulo merece.


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Sem assunto


A tela se ilumina e o espaço em branco aparece, apenas esperando pelas palavras que povoam minha mente e querem sair em busca do papel que já não existe, ou, então, apenas mudou de forma.

Os assuntos são muitos, tantos que chega a ser difícil escolher um. E tem para todos os gostos. Por exemplo, a vergonhosa atitude dos parlamentares concedendo-se um imoral – ou amoral? – aumento de quase 100% em seus vencimentos que já eram, digamos, generosos.

Tem, também, o aquecimento global, tema terrível que parecia ficção, depois parecia coisa para um futuro longínquo e que nunca chegaria, pois antes dele a ciência dar-nos-ia novas respostas e soluções. Depois ele passou a ser ameaça futura mais próxima, mas geograficamente muito longe dessa idílica Terra de Vera Cruz. Agora, o aquecimento está batendo às nossas portas e. ao olha-lo, percebemos que tem passaporte com passagens e paragens no mundo todo. Algo precisa ser feito e já.

A internet diz que a casa de um dos assassinos que incendiaram uma família, ainda viva, foi pichada com ameaças e ofensas. Amedrontada, a família mudou-se. Os assassinos também mudaram-se, foram transferidos para outro presídio. A crueldade dessas mortes é inaudita, é algo impossível de ser entendido. Por mais que pense e tente ser racional e civilizado, tudo que penso é que os dois assassinos devem morrer da mesma forma, e já, quanto antes melhor. Têm que ser justiçados. Precisamos da barbárie para salvar a civilização. O que resta dela, pelo menos.

No Japão, em Yokohama, mais um time brasileiro conquista o título mundial de clubes. Há um ano, exato, eu mesmo vivia essa emoção intensa, única, fantástica. O futebol faz bem às nossas almas feridas.

A China continua tomando mercados e diminuindo nosso comércio externo. Não demora e só teremos grãos e outros produtos agrícolas para exportar.

É tanto assunto que me vejo sem assunto e em dúvida: jogo freecell ou desligo o computador e vou dormir?

Vou dormir. Boa noite ou bom dia, ao gosto.


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sábado, dezembro 16, 2006

Paulistanidades


“É sempre lindo andar na cidade de São Paulo

De São Paulo...

A vida é grana,

O clima engana,

Em São Paulo...”

Gosto de andar na minha cidade. Até já foi minha, eu acho, em uma outra era. Hoje, é de ninguém, eu acho, também.

Eu acho muito. Mas já estou com idade bastante pra parar de achar.

Esses versos são de uma música do Premê, se a memória não me engana – que é só uma maneira mais comprida e besta de dizer eu acho.

No meio de tanto achismo, uma certeza: mesmo num sábado, só é civilizado andar por essa megalópole nas primeiríssimas horas da manhã. Foi o que fizemos hoje, saindo cedo de casa e indo pro centro da cidade, o Centro Velho. Na verdade, só passamos por ele, pois o destino era o Mercado Municipal, no Parque Dom Pedro. Chegamos cedo e... não entramos. A fila de carros era enorme, o estacionamento há muito já estava tomado, o sol começava a pôr suas manguinhas de fora e pouco passava das sete da manhã.

Desistimos. Como não podemos desistir do bacalhau pro Natal, o jeito será voltar amanhã, já que, por algum estranho sentimento, não gostamos de comprar bacalhau em outro lugar que não seja o Chiapetta do Mercadão.

Aproveitei o retorno prematuro e embarafustei o carro pelas quebradas do Bixiga, até a padaria antiga, antiqüíssima, pra comprar pão italiano da gema e lingüiça calabresa defumada com pimenta, muita pimenta. Com ela, um aviso: “O ministério da saúde adverte, etc e tal.” Nesses dias que correm ando escrevendo algumas coisas com minúsculas, mesmo, tipo ministérios, presidência, câmaras de deputados, vereadores e senadores (ora, o senado nada mais é que uma câmara, por sinal, a câmara alta; a dos deputados, portanto, é a câmara baixa; taí, fosse eu editor de algo mais que esse blog e só referir-me-ia doravante à instituição em questão como câmara baixa; tem tudo a ver... tudo).

Ao entrar na padaria um sorriso tomou conta de meu rosto, de imediato. Felicidade pura: sobre o balcão, uma travessa cheia de canollis fresquinhos, lindos e... saborosíssimos. Não esperei pelo atendimento – certas coisas não podem esperar – e já peguei, cuidadosamente, um dos tubinhos cheios de creme que sorriam para mim.

Como é bom comer um canolli assim!

Orra, meu, mas que creme me fazem aqueles caras, viu?

Como vocês podem ver, coisa de paulistano.

Assim como a 14 de Julho, a padaria.

Ela é de 1897, e como dizem, naquela época o Nono entregava o pão de carroça. Hoje, a carroça já não existe, mas o pão ainda é o mesmo. Se não mudaram nada nos últimos anos, quando a gente entra na área de panificação tem certeza que a data é aquela mesma, se não for ainda mais antiga. Compramos dois pães. Comi um pedaço de outro, acompanhando a degustação da lingüiça. Essa padaria é rica em visões e cheiros. E mais ainda em sabores, mas quem consegue provar tudo que está à mostra? Alcachofras, conservas em alho, cebolas, azeitonas, lingüiças, queijos, azeites...

Todo um universo de gostosuras.

Em plena manhã de sábado não é só o Mercado Municipal que regurgita de gentes e carros. A cidade inteira (cidade é como a gente se referia, e alguns ainda se referem, ao velho centro) está fervilhante e o trânsito, é claro, problemático. Normalidade paulistana.

Antes das nove da manhã estamos de volta à Granja Viana e a um verdadeiro café-da-manhã. A idéia era comer no Mercadão, mas não deu. Em casa, com o pão de 1897, está mais gostoso.

A próxima saída, sem ser a volta ao Mercado, é uma ida ao Morumbi Shopping pra conhecer as Starbucks tupiniquins. Amigos que já foram gostaram e recomendaram. Breve darei minha opinião.

Às vezes é bom viver em São Paulo ou em seus arredores.

Às vezes.


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É briga!


A vida no sítio é sempre cheia de surpresas e descobertas.

Cada dia é diferente do outro, e mesmo dentro de um dia são muitas as mudanças.

Final de tarde de sábado, tarefas concluídas, vacas e bezerros alimentados e separados, tudo pronto para a chegada da noite. Enquanto olhava as bezerras, ouvi uma barulheira estranha. Apesar de meio estranho, identifiquei-a como briga de gatos. Fui pro local de onde vinha o rebuliço, perto da varanda dos fundos, onde fica o tanque e, ao lado, guardamos um pouco de lenha para o fogão. Ao me aproximar, deparei com algo inédito em minha vida. Não eram gatos brigando, embora os gritos agudos lembrassem bastante, eram...

Dois ouriços brigando!

E como brigavam! Vieram correndo da matinha e entraram na varanda, indiferentes à minha presença, totalmente concentrados em suas próprias descargas de adrenalina.

E na varanda se engalfinharam, literalmente. Finalmente perceberam minha presença e se afastaram, mais uma prova da interferência do observador sobre eventos naturais, mesmo quando ele se julga apenas isso, um observador sem direito a voz e voto, mero assistente. O maior e mais forte voltou bamboleante pra matinha, satisfeito com sua vitória e a lição ao importuno (acho eu). O derrotado, um pouco menor e, talvez, fiquei pensando, o ouriço que prendi para os cachorros não atacarem mais há algumas semanas, contornou a casa. Podem não acreditar, mas ele tinha o andar de um derrotado e mantinha a cabeça mais baixa que o vencedor. Uma das gatinhas rodeou-o, mas nem se meteu a besta; olhou e foi embora, sem que eu precisasse dar uma bronca.



Cruzou o gramado e passou perto das vacas, no corredor que leva para os piquetes de tanzânia. Duas ou três mais curiosas aproximaram-se da cerca e ele mudou sua trajetória. Espantou as angolas que fizeram uma barulheira terrível – pra variar – com a agitação causada pela briga. Também curiosas, estavam ao seu redor, embora mantendo distância prudente. Pelo jeito, só os cachorros são imprudentes no que diz respeito a esses bichinhos.

Teimoso, persistente, ou simplesmente sem opções, enquanto o sítio entrava na penumbra que antecede a noite, o ouriço derrotado voltou pra matinha de onde tinha sido recém-expulso.

Na cauda, alguns troféus: espinhos do adversário cravados no couro.

Meio bíblico isso... Quem com espinho fere, com espinho será ferido.

E a paz da noite caiu sobre o Sítio das Macaúbas.


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sexta-feira, dezembro 15, 2006

Na Idade das Trevas



- Que vergonha isso! “Eles” dizem que vão aumentar o salário mínimo que a gente recebe pra trezentos e setenta e cinco, mas só em maio. E pra “eles” mesmos vão dobrar o salário logo de cara, no começo do ano.

Ás voltas com um trabalho meio chato, meio complicado e inteiro atrasado, respondi alguma coisa no piloto automático para minha mãe, sem me dar conta do que ela, de fato, falava. Pareceu-me, naquele momento, mais uma reclamação sobre o baixo valor da herança única de meu pai, a pensão de um salário mínimo. Mas, era mais, era muito mais que isso...

Era um misto de revolta, tristeza, vergonha, desencanto...

Só dei-me conta de tudo isso hoje cedo, quando a manchete do jornal, ainda no portão de casa, atingiu-me com a força e a dor de um murro no estômago:

“Parlamentares dobram salário”

E a coisa não parou por aí, revelou-se muito pior, já nas poucas linhas do texto de abertura do artigo:


Senadores e deputados, que já ganham 15 salários por ano, receberão R$ 24,5 mil mensais - Eles também criaram aumento automático, vinculado aos vencimentos dos ministros do STF - O efeito cascata já começou: a Assembléia Legislativa paulista vai aplicar o mesmo porcentual e pagar R$ 18,3 mil a seus deputados”


Confesso que estou sem fala.

Tudo que consigo pensar desde essa fatídica leitura é que o país não tem nenhum instrumento moral para julgar e condenar ladrões e outros bandidos. Esse pensamento ocupou minha cabeça e dali não sai nem a pau.



E por falar em pau, foi revoltante e errada a atitude da polícia ao defender os assassinos que mataram, pelo fogo, a família de Bragança Paulista. Desculpem-me todos que me lêem, sei que vou falar e escrever uma insanidade, mas seguirei em frente assim mesmo: os autores desse crime mais do que hediondo, impossível de descrever em todo seu horror, só podem ser linchados, vivendo seus últimos momentos em meio às chamas. Não pode haver cadeia, julgamento, prisão, anos e anos comendo, bebendo e dormindo às custas de quem trabalha e paga imposto para, no fim, voltarem às ruas e à vida livre como qualquer outro de nós. Não, há limites para o ato de ser civilizado. Nesse caso, os limites foram rompidos.



E para ninguém dizer que não falei de flores, falarei de milho, cujos pendões não deixam de ser flores.

Um juiz federal qualquer do estado do Paraná, emitiu uma liminar ontem proibindo a aprovação pela CTNBio da entrada no mercado do milho transgênico Liberty Link.

Não vou gastar o tempo de ninguém falando sobre os OGMs – Organismos Geneticamente Modificados – e sua importância para a agricultura e, principalmente, para a produção de alimentos com menor dispêndio de energia no seu sentido mais amplo.

Esse produto que acaba de ser proibido de ir ao mercado, não caiu do céu, pelo contrário, foi pesquisado, testado, acompanhado e já é utilizado há muitos anos em muitos paises com excelentes resultados agronômicos e econômicos, sem nenhum dano à saúde de pessoas e animais ou mesmo ao ambiente. Isso, todavia, não basta para os aldeões medievais e ignorantes travestidos em defensores do ambiente e dos consumidores que entram com ações paralisantes pelos tribunais desse país.

O resultado dessa ação é tenebroso: durante todo o ano de 2006 a CTNBio não aprovou um único produto oriundo da biotecnologia. Nem preciso dizer de nosso atraso em relação ao resto do mundo civilizado e desenvolvido.



E agora, relendo tudo que escrevi, percebo que quero queimar na fogueira os assassinos da família de Bragança, enquanto aldeões medievais e ignorantes paralisam o desenvolvimento e a prática científica e os donos do poder se locupletam criminosa e desavergonhadamente nos castelos, também conhecidos por casas legislativas, tribunais e assemelhados.

Vivemos nova Idade Média, é isso. E, para completar esses tempos medievais, só falta, agora, a Peste Negra.

Desculpem por isso, sinceramente. Juro que queria escrever outra coisa, qualquer outra coisa, mas não deu.



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segunda-feira, dezembro 11, 2006

Já foi tarde


Augusto Pinochet morreu.

Morreu tarde, demorou algumas décadas para que isso acontecesse.

Que queime nos mármores do inferno.

Pinochet e seus cúmplices sanguinários são, ao lado dos assassinos argentinos, alguns dos piores exemplos de gente que a humanidade produziu. Ainda existem, infelizmente, muitos outros igualmente indignos de viver nesse planeta.

Pinochet faz parte da minha vida, não essa que eu vivo, mas de outra, aquela que poderia ter sido se em 72 ou começo de 73 eu tivesse pego minha malinha com roupa & livros e ido para o Chile, ajudar a construir o socialismo como era meu sonho. Abortado antes de nascer.

Como poderia ter sido? Nunca saberei. E nem penso a respeito.



P.s.: eu já tinha escrito esse texto quando vi que a Cora já tinha escrito um com o mesmo título. Pensei um nanossegundo a respeito e cheguei à conclusão que alguns milhões de pessoas estão se plagiando. Ou melhor, estão sentindo o mesmo alívio, ainda que tardio, por esse passamento. Fica o título, portanto.



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Mangas & mangueiras


O pé de manga-coquinho carregou pouco esse ano. Mesmo esse pouco, porém, é muito, é muita manga. Curiosamente, ao contrário das nobres Haden, Tommy Atkins e Bourbon, a coquinho pode ser comida por um budista sem medo de ingerir o bichinho que talvez seja a avó reencarnada. E antes que me acusem de insensível ou coisa que o valha, peço desculpas pela brincadeira e nem sei se é o caso disso, pois já li e ouvi budistas falando a mesma coisa, em tons diferentes, claro, mas com o mesmo significado. Por sinal, um belo significado.

Voltando às coquinhos, elas raramente apresentam bichos e mesmo as doenças fúngicas são pouco comuns. É manga pra comer sem olhar pro caroço.

Contudo, manga, mesmo, boa de verdade, é a rainha das mangas, e que não por acaso tem nome de família real: a bourbon. Que maravilha! Que manga boa. Comer uma bourbon diretamente do pé é um dos grandes prazeres dos dezembros da vida, ao lado do chocotone e mais uma coisinha e outra. Os dois pés de bourbon estão bem, mas não com muita carga. A relativa raridade só aumenta o prazer de comer uma manga no ponto. E nesse ponto, pra falar em ponto, sou chato, pois gosto de manga quase madura, ou madura, mas não muito. Gosto de manga que permite a passagem da faca. Quando era moleque pegava as bourbon e espadas que abundavam na fazenda, já maduras, e chupava mesmo, de lambuzar mãos, braços e toda a cara, além de deixar a roupa em petição de miséria. Crescido, abdiquei de tamanha selvageria e passei a preferir o comodismo luxuoso da faquinha.

Das outras mangas nem falo, apesar ou justamente por serem abundantes em frutos, e bichos, e fungos. Nesse ponto não mudei uma vírgula desde os tempos de garoto: quero distância de fruta com bicho. Bem que me diziam pra largar a mão de ser nojento, mas não larguei. Deixo tais prazeres para outros.

Os pés de manga-espada são imponentes, majestosos. Nos dias de calor senegalesco, a visão de uma velha mangueira e sua generosa sombra já são o bastante para refrescar. O diabo é que quanto maior a mangueira, menos manga a gente pega e mais mangas caem diretamente no chão, onde apodrecem e fazem a festa da bicharada. São sombras boas, portanto, fora do tempo de manga. Quando moleque, deixava-me ficar nessa sombra por muito tempo. Às vezes de mistura com o gado todo. Hoje o tempo me falta para tanto, mas a vista continua bonita e prazerosa.

As vacas gostam da sombra das mangueiras no carreador.

E deixam as árvores "podadas" até onde suas línguas alcançam.



No sítio as mangas se perdem. As vacas gostam de comer todas as que podem pegar, coisa que me preocupa por causa do bendito caroço. Mas vai dizer a uma vaca que ela não pode comer a manga caída do céu bem à sua frente? Os passarinhos se divertem, fazem festa nas muitas mangueiras, além de trocentas ou mais espécies de insetos. Uma mangueira carregada é o centro de um amplo universo. Temos muita manga pra comer e quase nada para, de fato, produzir e entrar no mercado. O planejamento foi meio falho. De bom grado eu trocaria 90% das mangueiras por pés de lichia (eu não gosto, mas todo mundo gosta), abio, fruta-do-conde, pecã, abacate, etc, etc.

– Ué, se quer tanto assim, por que não planta outras frutas?

E quem disse que não plantei? Foram muitas e muitas mudas plantadas. Por mistérios insondáveis, de todas só meia dúzia ou pouco mais foram para a frente, inclusive um pé de genipapo que já está enorme e um dia ficará gigante. Além das secas, das formigas, das brocas, onde tem gado é difícil ter árvores, a menos que se erga verdadeira muralha ao redor de cada muda. As vacas adoram comer as folhas de quase tudo. Quando um pouco maiores, adoram se coçar nos caules, geralmente quebrando tudo e matando a planta, além de se privarem da confortável sombra futura.

Vacas não poupam, buscam o prazer presente.

Parecem-se com muita gente que conheço, a começar de certo escriba metido a cronista.

E paro por aqui, antes que desande a falar mal de gentes e coisas.

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sábado, dezembro 02, 2006

Sabatinas para um começo de dezembro


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1) O mundo curva-se ao Brasil...


... uma vez mais.
Em todo o mundo desenvolvido e até em parte dele em vias de, como a China, é grande a preocupação com o envelhecimento da população. O percentual de idosos aumenta e, por conseqüência, diminui o número dos que trabalham e sustentam a previdência em relação ao número dos que não trabalham e são sustentados pela previdência.
No Brasil, todavia, o envelhecimento populacional não é problema e sim solução. Para o resto do mundo, a problemática, para a Terra de Vera Cruz, a solucionática. A prova está na manchete do Estadão de hoje:

"IBGE: 64% dos idosos sustentam a família"

É isso, o brasileiro envelhece, mas segue sustentando os seus.

Como?
De onde vem o dinheiro que o idoso recebe para sustentar os seus? E porque os “seus” não trabalham?

Ora, e essas são lá perguntas que se façam numa manhã de sábado?
Francamente...



2) O mundo (civilizado) condena...


... e o Brasil apóia.

Janjaweed. Acostume-se a essa palavra.
Não estrague seu fim-de-semana, não a procure no google.
Nas ultimas temporadas de E.R., alguns episódios mostraram os Drs. Carter e Kovac e Pratt trabalhando em Darfur, Sudão Ocidental, território de caça da janjaweed, grupos paramilitares ligados, apoiados ou, vá lá saber, até parte integrante do governo sudanês, que caça, estupra, mata, aleija de bebês a velhos, que fazem parte dos povos nômades e semi-nômades dessa parte do país. Os números são imprecisos, como sempre, mas pensando baixo, mais de 200.000 pessoas já foram assassinadas pela janjaweed.
O governo e a janjaweed são árabes e muçulmanos, os povos caçados são pretos de diversas etnias e religiões.

Nessa semana, na ONU, o Brasil absteve-se de votar a favor de uma fiscalização internacional sobre o governo sudanês. Argentina e Uruguai votaram a favor, assim como outras nações civilizadas. O país do grande líder e guia espiritual dos povos não o fez, para alegria do governo sudanês que elogiou a postura do governo do grande líder, etc, etc e destacou que era a extensão de sua política de apoio à África.
Pobre e cada vez mais desgraçada África.

Confesso que me envergonho de ser brasileiro em muitos e muitos momentos.
Esse é um deles.



3) A volta dos bandidos...


Acabou a trégua que não houve ou, a volta dos que não foram.
Os bandidos, perdão, militantes do mst, ops... MST & correlatos, voltaram a invadir e ameaçar propriedades rurais produtivas. Tentaram nova invasão contra uma propriedade onde uma empresa tem laboratórios e campos experimentais, ao melhor estilo medieval. E, pasmem, invadiram o porto de Maceió!
O governo não aplaude, mas muito menos condena e não deixa de fornecer verbas, alimentos e bolsas diversas para todos. Uma festa.



4) “Paiaçada”...


... ou aritmética transgênica.

Em reunião da CTNBio com 21 membros do Conselho reunidos, 17 votaram a favor da aprovação de uma vacina para animais domésticos produzida a partir de microorganismos frutos da engenharia genética ou biotecnologia ou, ainda, organismos transgênicos. Mas 4 xiitas, digo, representantes da “sociedade” ou sei lá o que, votaram contra. Resultado: a vacina não foi aprovada graças à ditadura da minoria. Isso porque o grande líder e guia espiritual dos povos mudou a lei que constituiu a CTNBio, aumentando o Conselho que aprova ou não pesquisas e produtos, transformando o que deveria ser uma comissão de cientistas numa verdadeira assembléia-geral com maioria de leigos e militantes de causas diversas. Pior: estabeleceu que uma medida só será aprovada se tiver 75% ou mais dos votos, não dos presentes a uma reunião, mas do Conselho como um todo, o que explica como 4 é mais que 17.

A propósito: indivíduos de ambos os sexos e todas as idades da espécie Homo sapiens são tratados regularmente com medicamentos provenientes de organismos transgênicos. O melhor exemplo é o da insulina. Entretanto, indivíduos de ambos os sexos e de todas as idades da espécie Bos taurus, entre outras, não podem beneficiar-se de medicamentos produzidos de forma similar. Ou seja, fica claro que há um direcionamento...

Em tempo: a espécie Bos taurus compreende os bichos que chamamos de vacas, bois, vaquinhas, touros, bezerros...



5) Atrasados...


Bem de acordo com o país que representam, três senadores e um deputado viajaram, às custas do povo trabalhador e pagador de impostos, para aprazível cidade européia. Tão aprazível que, perdidos nos encantos urbanos, perderam, também, a principal palestra do encontro para o qual viajaram.

Não satisfeitos, atrasaram-se 70 minutos – uma hora e dez – para reunião com importante e ultra-atarefada autoridade internacional.

Eu já comentei que há momentos em que esse país me envergonha?
Ah, já? Então tá.



6) Aerolulla...


... de vento em popa, voando pelos céus do Brasil e do mundo.
Numa prova inequívoca da qualidade e liderança do grande líder (hummm... redundou, que chato) e guia espiritual dos povos, seu aviãozinho é o único em todo o país que decola, voa e aterrisa rigorosamente dentro dos horários previstos. Uma prova de eficiência para desmentir as más línguas que só sabem criticar e não enxergam os pontos positivos do grande líder, etc, etc e seu governo.


É, já deu, né?
Afinal, hoje é sábado, dia de cansar em outras atividades para descansar no domingão.

Bom fim de semana.


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