domingo, janeiro 31, 2016

Um janeiro normal e a sorte com o silo

O mês termina com 268 mm registrados aqui no Sítio das Macaúbas.

Um volume respeitável de chuvas, mas absolutamente dentro da média para o mês.

Dias atrás, porém, enquanto tivemos aqui 25 mm, na cidade choveu mais de 100 mm!
A represa, quase totalmente seca há poucos meses, transbordou. A água invadiu e cobriu o asfalto. Desceu um pequeno desnível e cobriu de água uma bela horta, parte em estufa, parte a céu aberto. 

Curiosamente, na véspera ou antevéspera desse dilúvio, ao passar por ali a caminho da cidade vi a horta sendo irrigada, com todos os aspersores funcionando, molhando as verduras. No dia seguinte o local parecia uma lagoa.

Prejuízo total para o horticultor e mais o prejuízo em diversas instalações e até em duas ou três das estufas mais próximas, também invadidas pela água.

- Nossa, como a verdura tá cara hoje!

Sim, minha senhora, meu senhor, é a chuva.

Às vezes ela falta, às vezes ela abunda.
(Abundar é um verbo feio, mas é um bom verbo.)


Aqui tivemos sorte.

De segunda pra terça caiu um mundaréu de água aqui pertinho, na Estrela. Na propriedade do Rubens o pluviômetro registrou mais de 30 mm, o que prejudicou os trabalhos no dia seguinte.
Enquanto isso, tivemos somente 10 mm aqui em casa e no dia seguinte, a terça-feira, começamos a cortar o milho para encher o silo. Armou chuva de terça pra quarta, mas, felizmente, não choveu.

A quarta amanheceu com cara de muita chuva. Medo.

Terminamos o corte e o transporte do milho, fechamos o silo como manda (quase) o figurino (faltou colocar uns cordões de sacos com areia ou terra sobre ele, mas, paciência) e...
Caiu a chuva durante a ordenha da tarde.

Tivemos muita, muita sorte mesmo!
De vez em quando é bom.


Seguem fotos do processo de ensilagem – o corte na lavoura (a planta é cortada próxima da base, picada inteira, inclusive as espigas com o milho passado do ponto de pamonha), a descarga num dos nossos dois silos-trincheira (gostaria de ter mais uns quatro, mas faltam-nos barrancos), a esparramação e compactação da massa picada pelo trator e o silo pronto, já coberto.
Por baixo uma lona nova (tá cara à bessa/beça), por cima a lona do ano passado.

Na base, no chão do silo, colocamos feno para fazer um piso. Ele protege o silo do contato com o solo e na hora de retirar e levar pras vacas não temos perda alguma. O próprio feno, molhado e temperado com a água perdida pelo milho, fica cheiroso, muito palatável, e as vacas comem tudo. 

Nesse ano inovei: cobri o milho com mais feno e só então colocamos as lonas.  Em maio, ou junho (de preferência), verei o resultado.

O feno que colocamos é tipo B ou C e nessa época do ano seu preço é muito baixo. B ou C acaba sendo teoria, pois não conseguimos achar fardos ruins, de fato, então o feno que foi pro chão é o mesmo que as bezerras e novilhas comem durante a noite.

A cada carreta aplicamos inoculante, que acelera a fermentação e melhora a qualidade do silo. O inoculante é como se fosse um fermento, tal como se usa nas cozinhas e padarias. Meio caro, mas compensa.

Fechamos o silo com alguma coisa entre 52.000 e 55.000 kg de milho picado. Isso é peso de entrada, peso bruto. O peso líquido, ou melhor, o peso seco, daqui a quatro meses ou pouco mais quando começarmos a usa-lo, terá caído uns 25 a 30%. Perda de água.

Um pouco mais de custo, um bocado a mais de qualidade.







sábado, janeiro 23, 2016

A Lua prateada, saudade da minha terra, saudade de Padre Nóbrega e dos tempos d’eu criança

A foto abaixo mostra o céu ocidental na madrugada desse sabadão, uns quarenta minutos antes do começo da ordenha da manhã.
Passava um pouco das cinco da manhã. Tinha acabado de fazer o primeiro café do dia e abri a cortina da janela da cozinha, que fica, justamente, voltada para o oeste ou, como diriam os anúncios de imóveis, tem face oeste.
E lá estava ela, a terra pisada por Neil Armstrong e mais alguns humanos, a Lua, em seu primeiro dia de cheia.
A Lua prateada da canção, clareando a estrada e o mundo.



A foto é pobre, sinto. Ela deveria mostrar a Lua emoldurada pelas árvores, um cenário bonito demais.
E quieto, sossegado, um pouco antes da passarada, fazendo alvorada, começar a cantar.

Depois veio o dia. Cheio, trabalhoso, cansativo.
Mudei a programação de corte do milho lá do Zé Fernandes de segunda pra terça. Hoje consegui o trator do novo vizinho, gente boa. Emprestou-me o Fordão com que, habitualmente, compactamos o milho picado no silo-trincheira.
Pra ganhar tempo, puxei pra amanhã a coleta e pesagem do leite de todas as vacas, individualmente, pra não atrasar os resultados e também para não sobrecarregar o meio da semana, quando a feitura do silo tomará todo nosso tempo fora das ordenhas e trato das vacas. Sobrou pro Dito. Amanhã vou busca-lo de madrugada. Enquanto eu fico na ordenha fazendo a coleta e a pesagem, ele cuidará dos bezerros.
Será mais um domingão como tantos outros, talvez com alguma chuva, já prevista para hoje.
Bom, nem sempre a previsão se realiza... Vamos ver.

Deixo para quem quiser ler, a letra de uma de minhas músicas mais queridas, especialmente nas vozes de Chitãozinho e Xororó: “Saudade de minha terra” – composição, verdadeiro poema, de Goiá e Belmonte.

“De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar

Adeus, paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão, eu quero voltar
Ver a madrugada, quando a passarada
Fazendo alvorada, começa a cantar
Com satisfação, arreio o burrão
Cortando estradão, saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
Sabiá cantando no jequitibá

Por Nossa Senhora,
Meu sertão querido
Vivo arrependido por ter te deixado
Esta nova vida aqui na cidade
De tanta saudade, eu tenho chorado
Aqui tem alguém, diz
Que me quer bem
Mas não me convém,
eu tenho pensado
eu fico com pena, mas esta morena
não sabe o sistema em que eu fui criado
Tô aqui cantando, de longe escutando
Alguém está chorando,
Com o rádio ligado

Que saudade imensa do
Campo e do mato
Do manso regato que
Corta as Campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Nas lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança
Daquelas festanças
Onde tinham danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem Ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas
mãos divinas

Pra minha mãezinha já telegrafei
E já me cansei de tanto sofrer
Nesta madrugada estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Já ouço sonhando o galo cantando
O nhambu piando no escurecer
A lua prateada clareando a estrada
A relva molhada desde o anoitecer
Eu preciso ir pra ver tudo ali
Foi lá que nasci, lá quero morrer.”

Ouço muito essa música, vira e mexe me ponho a cantarola-la, coisa em que sou um prodígio... De ruim.
E toda vez, toda vez, toda santa vez que escuto:
Nesta madrugada estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Toda vez minha memória voa pros tempos d’eu criança, saindo da casa dos meus pais com um tio ou amigo da família e indo pra Estação da Luz, onde, no final da madrugada, pegava o “trem de luxo” da Cia. Paulista de Estradas de Ferro (uma das ferrovias destruídas pelo governo burro de JK, trabalho continuado pelos governos cegos dos militares e dos que a eles se seguiram). Nunca viajei na primeira classe, só na segunda, que era uma maravilha. Mas bem que gostaria de uma vez só, uma vezinha só, ter viajado na primeirona...
Pra Marília, ou melhor, pra doce e querida Padre Nóbrega, onde o trem parava por um minuto ou dois, eram pouco mais de dez horas de viagem.
Pra Flórida Paulista, onde ficava a Fazenda Saudade, que meu avô administrava, eram catorze horas.
Catorze horas!
No mínimo umas três ou quatro eu passava na plataforma, vendo a paisagem, sonhando com a minha própria fazenda num dia futuro.
Memórias indeléveis. Mais que memórias, tudo isso é parte do meu DNA. Estou certo, nem preciso de teste para confirmar.


sábado, janeiro 02, 2016

Chove chuva, chove sem parar... E da chuva para a crítica

Chove chuva, chove sem parar... E da chuva para a crítica

Chove no Macaúbas.

Uma pancada de respeito agora à tarde acrescentou mais 25,0 mm ao ano em curso. A soma já  vai em 43,0 mm e estamos no segundo dia do mês e do ano.
Nos últimos 10 dias são 125,0 mm acumulados.

O leite quebrou um pouco – tradução: a produção de leite das vacas sofreu uma queda. Chuva demais, conforto a menos.

O barro abunda.
A frase é horrorosa, mas quem disse que a realidade não é, por vezes, horrorosa?







Um vizinho veio buscar uns sacos de adubo bem a tempo de pegarmos o início do chuvão e nos molharmos mais que o desejável.

Virei praticante do velho escambo.

O escambo é necessário à sobrevivência. 

Estou usando o adubo de uso futuro e de uso presente suspenso pela impossibilidade de fazer investimentos para pagar parte da conta da comida que as vacas comeram na seca que há muito ficou para trás.

Meu caixa, que é mera teoria numérico-contábil, dá uma respirada (teoria respira?) (sim, teoria respira) e a gente empurra tudo para o futuro.


Há quem diga que o ano será bom para nós, os produtores de leite. 
Analista de respeito disse que a queda observada na produção levará, forçosamente, a um aumento no preço pago a nós da ordem de 15%.

Uau! Que maravilha...

Só que não.

Esse “nós” do analista tem como base os produtores de mil litros diários para cima. 
Pequenos como eu, hoje com duzentos, em fevereiro com trezentos se nada acontecer errado, não estão na alça de mira dos analistas. Nossos aumentos são menores.

Por outro lado, o mesmo analista diz que teremos uma alta de pelo menos 12% nos custos, especialmente de ração.

Ora... Bom, deixa quieto. 
Esse analista é discípulo fiel e cego dos propagandistas do governo, que estouram champanhes pelos onze e cacetada porcento de “aumento” do salário mínimo, quando a inflação do ano foi de... 11%.

Inflação oficial e teórica, posto que na prática, na tal de vida real, ela foi muito superior.


Outro problema com analistas e suas análises: focados nos grandes, eles ignoram que nós, os pequenos, temos custos maiores porque não temos capacidade e volume para conseguir descontos e para fazer compras antecipadas aproveitando ofertas. 

A gente almoça o leite que será produzido na janta, isso, é claro, se tivermos sorte. 

Na verdade, estamos almoçando hoje o leite que será produzido no mês seguinte.


Então, é assim.
Há uma crise.
Há, na verdade, duas crises.
Uma é geral, genérica, formal, oficial e grandiosa.
É a crise que se comenta em grandes discursos.

É a crise que os defensores “disso tudo que está aí” dizem que não existe ou que é exagerada. Ou, cientes do tamanho do monstro, aproveitam qualquer coisinha, por mínima que seja, para desviar o assunto, o foco e o rumo.


A outra crise é miserável, específica, desconhecida dos “grandões” (como uma amiga suíça se referia aos donos dos poderes). É a crise minúscula da falta de dinheiro para o aluguel da casinha minúscula e já miserável na periferia da periferia das cidades. 

É a crise que os "defensores" dos trabalhadores desconhecem. 
Nem podem conhecer, pois, na maioria, eles só conhecem “trabalhadores” dos sindicatos e para esses é tudo sempre uma beleza, sem chuvas, nem trovoadas.


Essa outra crise, a crise dos miseráveis, é também a crise dos pequenos produtores de leite, dos pequenos produtores rurais de tudo, dos pequenos industriais, dos pequenos comerciantes, dos pequenos empresários...

É uma crise que os donos do poder e seus defensores – tão cegos quanto calhordas – também ignoram. 
E ainda nos chamam de “coxinhas” quando reclamamos.


Um dia, espero que não, mas, sei lá...
Um dia hei de dizer em alto e bom som tudo que penso dessas pessoas.
Serei execrado.
Serei chamado de um monte de nomes.
Perderei um monte de amigos.

E meu fígado agradecer-me-á profundamente.
E viverei em paz com ele, meu precioso fígado.


sexta-feira, janeiro 01, 2016

Um ano molhado

Um ano molhado

Assim foi 2015: molhado.
O ano fechou ontem com 28,5 mm durante a noite, antes de começarem os fogos da passagem.
Dezembro fechou com 187,0 mm.
Na soma com o incrível novembro o total foi de 500,0 mm!
E o ano inteiro acabou com 1.468,0 mm.

Bom demais, claro, apesar do barro.
As terras do Sítio das Macaúbas são bem permeáveis, um solo areno-argiloso que absorve bem as águas. Nosso lençol freático deve estar bem cheio.


Um ano molhado, sim, mas nem tanto


Essa precipitação total próxima de 1.500 mm não é, porém, nada de extraordinário. A média de chuvas aqui em Santa Rita do Passa Quatro, de acordo com dados da UNICAMP  e seu Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura é de 1506,8 mm. Portanto, o ano ainda esteve 2,6% abaixo da média.
Mesmo assim, foi bom demais.

Por sinal, a média geral do Estado de São Paulo gira um pouco para cima dos 1.500 mm anuais.


Um problema, nesse ano de 2015 e em quase todo ano, é a forte concentração de chuvas num período curto e sua ausência em outros. 
Se em novembro tivemos 313,0 mm, tanta chuva que foi até ruim, em julho tivemos 13,0 mm e no tenebroso agosto apenas 4,0 mm, fator agravado pelo Sol terrível e pelos ventos secos, que, literalmente, chupam a umidade do solo, secando-o e ressecando-o. 
Chegou setembro e com ele chegaram as antigas e sumidas chuvas da primavera. Ficaram concentradas, porém, num período de dois ou três dias logo no início do mês, entre os dias 7 e 12, com 115,0 mm. Depois... 
Depois a repetição de agosto, com Sol inclemente e os malditos ventos secos, voltando a chover apenas no finalzinho do mês.

Esses períodos secos, quentes e com muito vento são mortíferos para as plantas e deprimentes para os animais. E humanos.


Agora, é torcer para 2016 se manter na média histórica, o que já será fantástico.

O Sistema Cantareira teve um bom ano, mas 2016 pode e precisa ser melhor. É ficar na torcida. 

Para voltar à normalidade de reservas, o Sistema precisa de três temporadas de chuvas normais. 

Historicamente, esse é um comportamento climático normal para a região e para o Estado. 

Lembrando que entre 1º de julho de 1891 e 30 de junho de 2013, o estado de SP teve apenas 5 anos com precipitações inferiores a 1.000 mm (na verdade, inferiores a 950 mm) e todos esses anos secos foram seguidos por anos molhados, o que não aconteceu entre o final de 2012 e 2014.  

Nesse período o comportamento foi duplamente anormal: em relação ao volume total de chuvas e em relação à duração do período seco, que pegou, praticamente, três diferentes temporadas.


Então, é isso. Hoje, primeiro dia do ano, o tempo com cara de chuva.
Que assim seja.