sábado, maio 24, 2008

Notícias do lado de lá do planeta


(Ora, o planeta é um globo, portanto não tem lado, mas quem liga pra isso?)

“...estamos no meio da selva de Java (Grajagan, lembra da foto do por do sol?!) - uma loucura! Essa aventura é para apenas UMA vez na vida! Aqui é jungle mesmo, animais, floresta, mar, e até pessoas...

Mas é uma experiência muito bacana de vida”

O e-mail, curto como os outros, é da minha filha, Carolina, que com o marido anda por Bali, Mentaway, Grajagan, Kuta, nas águas e terras da Indonésia. A caminho de casa, farão mais uma parada, dessa vez na África do Sul, para mais ondas numa praia também famosa pelas visitas dos tubarões brancos. Em outro e-mail ela disse que as ondas são “animais”. Num outro, espantada com a quantidade absurda de turistas em Bali e região, disse que se tivéssemos um terço daqueles turistas nessa Terra de Vera Cruz, ela e o Rodrigo seriam ricos e iriam surfar em Bali & adjacências todo ano.

Eis uma hipótese que não me agrada em nada: eles em Bali & adjacências todo ano.

Cresci lendo e assistindo filmes – lembram de Krakatoa, o Inferno de Java? – rodados (ou não) naquelas montanhas e águas, povoadas por vulcões e caçadores de cabeças. Os primeiros andam adormecidos, felizmente, enquanto os segundos simplesmente espalharam-se por muitas partes.

Desde que eles viajaram, logo depois do ciclone sobre Burma, ou Myanmar, como querem os assassinos uniformizados que dominam o país, olho mais preocupado que o normal para tudo que acontece por lá. Enquanto ainda segue a contagem das vítimas e os órgãos internacionais de socorro humanitário tentam permissão – conseguida a duras penas, com muitas restrições – para entrar no país, acontece o terremoto em Sichuan, terrível, quase 8 na escala Richter, logo seguido por outro, menos intenso, mas que também provocou mais mortes e danos.

Não bastassem os cataclismas naturais, agravados pela insânia humana, essa última se revela agora em toda sua bestialidade, em plena África do Sul, onde os pobres e miseráveis perseguem, torturam, estupram e matam das formas mais cruéis outros pobres e miseráveis. Tudo por causa de emprego, a disputa por poucas vagas de trabalho e míseros salários, insuficientes para nada mais além da mais precária sobrevivência.

A cada novo ano que entra, a cada novo ano que acrescento aos que já vivi, aumenta minha vontade de ficar recolhido ao meu ninho, minha toca, meu buraco. Não sei se isso é conformismo, medo ou comodismo, ou somente preguiça, é um prazer cada dia maior simplesmente ficar em casa, seja na Granja, seja no Sítio, e conviver com as coisas que me são caras.

De certa forma esse desejo é alimentado pelo fato do mundo estar à minha frente todo dia, toda hora, como, por sinal, nesse momento em que escrevo. Acabei de deixar para trás a edição digital do New York Times de hoje. Não perdi tempo lendo sobre a insana batalha de Hillary contra Obama. Bobagem, dará Obama e ponto, quanto antes melhor, na indicação democrata. Depois, contra McCainn, a história será outra, provavelmente com o mesmo final: Obama. As minúcias do dia-a-dia dos três já não me interessam, ao contrário da manchete do NYT: 270 imigrantes ilegais condenados.

A administração Bush parece um tormento sem fim. Já falei antes e repito: nela, o que abomino e deixa-me amedrontado, não é sua sanha intervencionista em outras nações, ao fim e ao cabo limitada ao Iraque (o Afeganistão foi outra história, na minha opinião), mas sim a sua sanha intimidatória e repressora dentro dos Estados Unidos, contra cidadãos, tanto americanos como, principalmente, estrangeiros. O rigor da Imigração contra os ilegais no país recrudesceu. De maneira geral, esse tipo de ação agrada às massas, historicamente.

Esse caso, por exemplo, é típico: as autoridades fizeram um raid, ou blitz, no estado de Iowa, e somente num grande frigorífico prenderam 389 trabalhadores. Desses, nada menos que 270 foram condenados a 4 meses de prisão, após declararem-se culpados. Caso não o fizessem, seriam julgados por uma coleção de outros crimes, cujo resultado seria uma pena mínima de dois anos de detenção. O dramático, perigoso, assustador e verdadeiramente criminoso nessa história toda, é que tudo isso aconteceu em 4 dias. Apenas e tão somente quatro míseros dias. Os ritos processuais foram atropelados em velocidade de Formula 1. Ou de NASCAR, para ficar dentro do gosto americano.

Contra esse rigor policialesco seguido pela administração sumária da justiça, muitas vozes, as mais diversas, ergueram-se contra, mas são vozes liberais, logo, contam menos que desejável. Essas medidas dignas de estados policialescos, como a ditadura instalada em Burma, não se aplicam somente contra estrangeiros, mas também contra cidadãos americanos – claro que, novamente, com maior rigor e freqüência contra aqueles que, mesmo americanos, têm sobrenomes que não são tradicionalmente anglo-saxões.

É isso que me assusta nesse governo infeliz para o país e o povo americanos, e para a humanidade como um todo. Nesse momento, se há um país para o qual não tenho a menor vontade em voltar, apesar da paixão por muitos de seus lugares, é justamente os Estados Unidos. Será diferente com Obama ou McCainn? Duvido. Ou melhor, sim, haverá diferenças, mas nesses casos eu tenho sérias dúvidas que um ou outro desfaça as armações perpetradas pela administração Bush.

Segue a vida, e do outro lado do mundo Carolina informa que passaram uma noite em Jacarta, a caminho de Kuta e dali para Mentaway, em busca de novas e melhores ondas, uma mais perfeita que a outra.

Precisamos todos de novas e melhores ondas, e que uma delas leve George W e sua tralha fundamentalista para o lixo da história.


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domingo, maio 18, 2008

Política de lá e de cá para pensar aqui


O crime de Obama contra o Islã


Há anos li algo sobre os muçulmanos condenarem à morte quem troca de religião. Essa determinação, chocante e absolutamente contrária a tudo que acredito, ficou adormecida em minha memória.

Com o crescimento da candidatura de Barack Obama e sua origem de pai muçulmano, algo me incomodava, mas eu não sabia o que era. Tampouco dei maior importância ao incômodo, afinal, o moleque Barack perdeu o pai, morou com a mãe, cresceu como cristão, logo, não haveria zonas cinzentas nessa história.

Mas há, e ela é muito mais que cinzenta.

O jornal O Estado de S.Paulo de hoje traz uma matéria que julgo ser extremamente importante, infelizmente. Seu título é “O crime do senador contra o Islã” e sua leitura, tenho certeza, é muito importante e, infelizmente, esclarecedora.

Clique no link:

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20080518/not_imp174551,0.php

Não deixe de ler, recomendo pela última vez.

Raios e relâmpagos no horizonte

Uma amiga disse que os Estados Unidos estão mais propensos e mesmo prontos a eleger um presidente negro que uma mulher. É uma tese interessante, na qual eu acreditaria piamente, não fosse o poder (suposto) do voto jovem, entendendo-se por jovem os que têm menos 40 e, principalmente, cresceram e moram nas áreas mais evoluídas (na falta de melhor adjetivo) dos Estados Unidos.

Mas... E a força feminina? Perguntei a um grupo de amigas em quem votariam e a resposta foi unânime: Hillary. Será que suas colegas de idade, classe e cabeça votarão do mesmo jeito? Tenho dúvidas.

Obama lutará contra McCain e contra Hillary, também, não se iludam. O primeiro será seu competidor direto e às claras, disputando voto a voto, em novembro, o direito de presidir o maior país do mundo por 4 anos. A segunda será competidora indireta. A ela, definida por muitos como um animal político, de forma alguma interessa uma vitória do candidato de seu partido, fato que deixá-la-ia alijada da disputa pelo poder supremo até 2016, um ano muito distante para ela pensar em qualquer coisa além de doce aposentadoria, controlando, digo, educando os filhos da Chelsea.

Os ares até novembro estarão perigosos, cortados por toda parte por raios lançados por todos os lados. Entre os mais perigosos, ou mais sujos, estarão os raios do fogo amigo.

Enquanto o mundo avança...

O que acontece conosco, sul-americanos?

Por que sonhamos em viver nos Estados Unidos e ao mesmo tempo, aqui, em nossa casa, jogamos no lixo praticamente tudo que nos faz desejar morar em Norte América?

Lugo, no Paraguai...

Torres, no Equador...

Chávez, na Venezuela...

Morales, na Bolívia...

Gostamos do luxo fora e da miséria em casa, será isso?

Nada como o progresso alheio e a miséria pessoal?

Pobre Latino América, tão rica, tão pobre.


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Reflexões e revelações de uma noite sabatina

Não tenho mais por onde fugir.


(E se você, leitor paciente, já fugiu desse texto iniciado com um “não”, não se preocupe, não irei reclamar de sua ação; sim, não irei porque sei que não se começa um texto com não).


Os argentinos descobriram-me, agora o jeito é ceder e embarcar. Aguardo apenas a passagem e a confirmação da suíte no hotel buenairense de minha escolha, pois o congresso acontecerá na linda capital portenha, embora eu preferisse, mesmo, que fosse na muito mais linda San Carlos de Bariloche, no fantástico Lau Lau. Porém, aprendi em outras eras que a cavalo dado não se olha os dentes. Hoje, contudo, dado o preço do feno, das vacinas, das rações e outras coisinhas mais necessárias ao bem-estar eqüino, não só é o caso de olhar-se muito bem os dentes, como também de pensar bastante a respeito de tal presente. Os custos atuais estão fazendo de todos os simpáticos e maravilhosos cavalos... cavalos de Tróia. Nem por isso, entretanto, abrirei mão de manter o Brioso comodamente instalado no Sítio das Macaúbas, além do que, tão logo me mude, darei a ele a companhia de um ou dois parceiros de pasto & feno. Cavalo é paixão e paixão não tem preço. Tal e qual as minhas vaquinhas.


Os argentinos... Pois é, os hermanos descobriram meus pendores para a arte médica e meus profundos conhecimentos a respeito, associados ao gosto que tenho pelas causas jurídicas que rendem grandes debates nos tribunais, chegando, inclusive, à Suprema Corte.


Ah, vocês desconheciam essas minhas facetas?

Pois não deveriam.


A prova está no convite que recebo a cada oito ou dez dias, lembrando-me, instando-me, mesmo, a participar do VII Congreso Argentino de Derecho Médico y de Salud, a realizar-se brevemente em Buenos Aires.

Não, nem adianta pedir-me consulta médica ou jurídica. Apesar do convite para o Congresso citado, não sou médico e menos ainda jurista. Esse último menos ainda tem sua razão de ser, uma vez que, em relação ao primeiro, como diz o povo, de médico e de louco...


Apesar de ser um sem-diploma na vida, e já em dúvida se o meu diploma da vida é verdadeiro ou veio da China via Ciudad del Este, sou um perito nessas artes, como já disse. Consegui chegar onde cheguei graças ao inestimável aprendizado com os Doutores Gregory House e Alan Shore.


O primeiro, para quem não conhece, médico de grande prestígio entre o povo dos Estados Unidos e do Brasil, mas aqui somente entre os felizes espectadores das tevês a cabo. Dr. House tem muito prestígio, também, entre as classes dos artistas e publicitários. O segundo, o Alan Shore, é advogado de enorme prestígio em Boston, terra de grandes juristas de tradição liberal.


Estamos juntos toda semana, eles na telinha e eu no sofazão, e dessa forma damo-nos muito bem.


Sou craque em diagnósticos estranhos. Já vou adiantando que, dependendo do jeito que a pessoa está à minha frente, de cara já sei se se trata de um caso de lupus ou sarcoidose. Ressonâncias e tomografias são comigo mesmo. Diante de um tomógrafo de última geração, comporto-me da mesma forma que diante de portentosa ilha de edição. Sou fera no assunto. Ao contrário do Greg, porém, meu cinismo é tímido, mais mental que oral. Uma vantagem, segundo alguns, uma enorme desvantagem, segundo a maioria dos pensantes.


Como o Alan, sou liberal e conservador ao mesmo tempo. Gosto de velhos valores (ainda mais se ao portador e penhoráveis), mas apego-me ao seu espírito, não às suas letras, pois também gosto das coisas novas. Sou novidadeiro, se alguém quiser me conquistar é simples: um McBook com 4 gigas de memória RAM, HD de 200 gigas, todo equipado com tudo de direito e muito mais. Taí um negócio simples e que, certeza absoluta, conquista-me totalmente.


De alguma forma a organização do VII Congreso Argentino de Derecho Médico y de Salud descobriu-me e às minhas qualificações. Os vendedores de livros já conhecem meus gostos e enviam-me tentadoras propostas literárias, tão tentadoras quanto as propostas de mirabolantes viagens por todo o mundo. Por sinal, trabalho mal empregado, pois de todo o mundo só interessam-me, a rigor, a Toscana, a Provence, as estepes da Ásia Central, o Himalaia, o Kilimanjaro e a Grande Barreira de Recifes, além de ver ao vivo e a cores alguns grandes jogos em Barcelona e Madrid, principalmente. Portanto, poupem-me das ofertas para Los Angeles, Chicago, mesmo New York – essa, só depois que Obama assumir – e, principalmente, Miami. Tudo, menos isso. De repente dou de cara com o tal Horatio, aquele do CSI Miami, com sua eterna cara de quem comeu demais e não gostou de nada.


De tudo que recebo em minha caixa de entrada internética, tenho ficado incomodado somente com repetidos, inumeráveis e originalíssimos e-mails que me prometem mais 4 polegadas! Mas que diabos vou fazer com mais 4 polegadas?


Um verdadeiro absurdo, principalmente se lembrarmos que a formosa Marta Rocha perdeu o cetro universal porque tinha 2 polegadas a mais.


Eu, hein?


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quarta-feira, maio 14, 2008

Ambiente ao deus-dará

Dona Marina pediu as contas e foi embora. Assim, de repente.

Discordo de muitas coisas de sua ação e omissão como ministra, mas reconheço nela uma batalhadora pela preservação da floresta, principalmente. Nesse ponto o país perde. Mas ganha, na minha opinião, na questão dos transgênicos, que sempre foram combatidos de forma extremada por ela e seu ministério. Um verdadeiro paradoxo, pois os transgênicos permitem a prática de uma agricultura de alta produtividade com menor dispêndio de energia, aqui entendido tanta a energia propriamente dita, na forma de combustíveis e eletricidade, mas também a energia em seu contexto mais amplo.

Ganha o país na questão do etanol e dos biocombustíveis, mas é um ganho perigoso se não houver fiscalização e controle na expansão das áreas cultivadas.

Perdemos, porém, na questão das hidrelétricas na Amazônia. Ainda agora não consigo enxergar com bons olhos as hidrelétricas de Rondônia e, fora de qualquer discussão, Monte Belo, no Alto Xingu, é apavorante, apesar de promessas de baixo impacto e coisa e tal. Para mim não cola.

Quem sabe o país ganhe com a chegada de alguém que ponha o dedo nas feridas ambientais provocadas por militantes ditos “sem terra” e índios? Utopia, ninguém vai mexer com esse pessoal.

Essa minha visão não é “assassina” ou coisa que o valha, é simplesmente realista.

Os invasores messetistas devastam todas e quaisquer áreas, ignorando solenemente compromissos de preservação de 20, 30, 50 e até 70% da área. Abastecem, de forma legal e “legal” o comércio de madeira em muitas regiões, mesma prática adotada por muitas tribos indígenas, hoje muito mais plugadas em antenas parabólicas do que em andar pelados, caçando e pescando com arco-e-flecha. Foi-se o tempo.

Uma área é certa que seguirá perdendo de goleada: a transposição do São Francisco. Nessa, ninguém mexe, é absolutamente intocável, a “grande pirâmide” de Luiz Inácio. Dona Marina omitiu-se vergonhosamente. Isso, tirou-me quase todo o respeito que eu tinha por ela, sobrou apenas o respeito básico devido a todo ser humano e um pequeno respeito por algumas ações, sempre ligadas às florestas.

Agora é ver o que virá. Essa é mais uma demonstração que Lula faz o Governo Lula, jamais o governo que seus defensores imaginavam. Mas isso todo mundo já sabe há muito tempo. Quanto ao ambiente, continuará como sempre ao deus-dará.


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segunda-feira, maio 12, 2008

Ondas e outras coisas


Dia das Mães, por volta das nove e meia toca o telefone.

É minha filha ligando de Bali. Falamos rapidamente, com o devido delay para a voz chegar e voltar, afinal, Bali é longe pra burro, mas não para surfistas. Ela falou só comigo, pois a Rosa tinha saído. Está adorando Bali, é tudo maravilhoso, etc e tal. Ela e o marido não compraram um laptop em Cingapura porque acharam caro. Preferiram deixar para comprar no Brasil, depois que voltarem.

Meu queixo caiu e fiquei sem resposta.

Parece que o real anda mesmo valorizado e o dólar desvalorizado.

Voltando à paradisíaca (dizem, não conheço) Bali, ficarão por ali mais alguns dias, pegando ondas. Depois vão para Mentaway, na ilha de Sumatra. Antes tem outra parada não sei onde, e por fim, já no caminho de volta, Jeffers Bay na África do Sul, lugar aprazível também para ver tubarões-brancos, aqueles mesmos.

Ufa! Só de relatar já fiquei cansado.

Viajar, hoje, é algo plenamente pensável para qualquer cidadão com razoável ficha cadastral, e por razoável entenda-se não ter protestos e ganhar mais de um salário-mínimo. O crédito está fácil, abundante, oferecido e descarado.

Fácil de pegar.

Difícil de pagar.

Como sempre, mas quem pensa nisso?

Felizmente, o casal surfista primeiro guardou os caraminguás e só depois viajou.

Meno male. E certeza que a viagem será lembrada com saudades e carinho.

Mas não estou escrevendo esse post para ser um relato financeiro/familiar/turístico.

O motivo é outro.

Java, Sumatra, Indonésia e outros mais, são nomes que conheço desde moleque. Sempre associados a vulcões, maremotos, terremotos e agora tsunamis. Esse longo passeio por ali tudo, confesso envergonhado, às vezes preocupa-me um pouco.

Por mim, teriam voltado para a verdadeiramente paradisíaca Itacaré – conheçam antes que façam ali um megaporto e destruam tudo – ou para a não menos espetacular Fernando de Noronha.

Mas, o chamado das ondas perfeitas falou mais alto, calou mais fundo em seus desejos.

A ligação para cá foi feita do hotel, imagino. Não quiseram levar seus celulares, talvez com receio de receberem ligações fora de hora e fora de orçamento, o que é pior.

Semana passada meu filho estava em Buenos Aires. Depois de deixá-lo no aeroporto e já na longa viagem de volta de Cumbica para a Granja Viana, lembrei-me de algo a falar com ele. Liguei para seu celular, mas já estava desligado. Bom, paciência, depois eu conto.

Horas depois, ouço o alerta de mensagem chegando no meu celular. Fui olhar e era mensagem do celular dele, já na capital porteña, informando que já estava disponível para receber ligação.

Ora, por que não?

Dito e feito, liguei e quase de imediato começamos a conversar. Assim foi por várias vezes, geralmente uma por dia. Que coisa... É vapt-vupt, liga e alguém atende no outro lado do mundo ou bem ao sul do Rio Grande.

O melhor local e horário para falar ao celular é no trânsito paulistano.

Sim, é proibido, eu sei.

Sim, tem multa, eu sei.

Sim, é perigoso, eu sei.

Porém, quem disse que eu falo com o carro em movimento?

(Até faço isso, mas atire a primeira pedra quem não?)

Falando ao celular o tempo passa e a gente não percebe.

Mesmo à fantástica velocidade de cinco ou seis quilômetros por hora, em algum momento chegamos ao destino e, se conversamos muito e bem, nem sentimos a passagem do tempo.

Para alguma coisa serve o trânsito: conversar pelo telefone.

Para alguma coisa extra serve o celular: suportar o trânsito da Paulicéia.

Queria um livro lá de Buenos Aires, um livro que comprei em conjunto com um amigo, mas, com as mudanças da vida, ficou com ele e nunca mais vi, nem um, nem outro.

A lembrança desse livro me persegue há anos. Agora, com os 40 anos da Primavera de 68, o desejo volta mais forte. Nele, o autor dá imagens inesquecíveis, para mim, do que foi a revolução que não aconteceu, mas mudou o mundo.

O livro é o Ultimo Round, de Cortazar, um de seus livros menos conhecidos e, para mim, um dos melhores. Ora, mas por que eu queria esse livro vindo de Buenos Aires? Porque o que eu quero é o mesmo que eu tive, no comecinho dos 70, a primeira edição, da Siglo XXI mexicana, quebrado em duas partes, como vemos em livros infantis, uma separada, distinta, da outra. Já andei procurando por ele aqui em São Paulo, claro, mas ainda não achei.

Tem na Amazon, claro, mas tá caro pra burro.

Uma palavrinha com São Google e descobri-o em duas ou três livrarias que vendem livros antigos em Buenos Aires. Ah, mas quando vi o preço do livro em melhor estado, desisti: 200 dólares! É muita areia pro meu atual caminhãozinho. Mas hei de encontrar e comprar esse livro. Enquanto isso, se alguém tiver oportunidade, recomendo a leitura. Aliás, recomendo tudo de Julio Cortázar, como, por exemplo, Libro de Manoel, leitura assaz indicada para os dias que correm.

Desisti do Ultimo Round buenairense. Acho que vou encontrar essa obra muito mais em conta por aqui mesmo. Mas ainda vou checar Madrid, Barcelona e México. Afinal, internet e google servem para isso mesmo.


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sexta-feira, maio 02, 2008

Site ou sítio?


Sabem os leitores desse Olhar Crônico e desse Olhar Crônico Esportivo, ou deveriam saber, que sou um amante da língua portuguesa. Também o sou da língua portuguesa falada no Brasil. Não é difícil vocês encontrarem palavras e expressões que no dia-a-dia nosso estão em desuso ou já trancafiadas no arquivo morto.

Desuso e trancafiadas: duas palavras não muito comuns, né?

Para ajudar, esse “né”, que o Houaiss não só reconhece como classifica na mui digna e útil família dos advérbios.

Aliás, até mesmo esse “Houaiss” tem significado próprio, tendo sido empregado como sinônimo de e referência a um dicionário.

Marketing é palavra usual nos meus escritos, mormente no Olhar Crônico Esportivo e, confesso meio sem graça, já usei o vocábulo mercadologia, porém muito mais como uma curiosidade do que propriamente como sinônimo de marketing. Nem dá para comparar um e outro, não é mesmo? Claro que vocês, leitores cultos e bem informados, sabem que esse mormente empregado aí atrás e principalmente ou sobretudo são a mesma coisa, assim como maiormente, do qual mormente é uma contratura – não muscular, mas gramatical. Embora qualquer guri “analfabetizado” por nosso sistema de ensino saiba o que é uma contratura muscular, ele ignora, desconhece, não tem a menor idéia do que seja uma contratura gramatical. Se bem que, verdade seja dita, o comum e correto é dizer contração gramatical e não contratura gramatical. Contudo, contratura é sinônimo de contração, logo, é perfeitamente lógico usá-la para explicar o né e o mormente.

Contudo, contratura, contração... Com tudo isso a razão de ser desse texto perdeu-se em algum lugar lá pra (mais uma contração ou contratura) trás.

Graças ao meu GPS específico para textos, principalmente os metidos a besta, descobri onde foi que fiquei perdido: logo no início. Voltemos, portanto, a ele.

Sabem, também, os leitores, sobretudo os do Olhar Crônico, que sou o feliz, embora acabrunhado, proprietário do Sítio das Macaúbas. Sabem todos os brasileiros leitores desses blogs que sítio é um pedaço de terra usado para a prática agrícola ou para a criação de animais, vacuns na maior parte, os populares bovinos, mas também porcinos, caprinos, ovinos, eqüinos e outros, até mesmo girinos e alevinos, que depois crescem e, mudando de tamanho, mudam de nome, passando a serem chamados de rãs e peixes. Isso é um sítio, local costumeiramente contemplado com belas e desertas piscinas, sonho de onze em cada dez urbanícolas que sonham com uma vida mais doce, quieta, realizadora...

Dizem os dicionários, e somente eles, que sítio é o mesmo que local, lugar, e é, também, endereço.

Apegados a essa visão dicionaresca da cultura e da vida, muita gente boa e muita gente nem tanto, como certo deputado, prega o uso dessa palavra em lugar de site – sáite, em bom português tupiniquim – para designar endereços de internet, as populares romipeiges, ou homepages, como falamos no moderno português praticado nesse imenso bananal.

Que sandice! Coisa mais boba dizer para um amigo: “Acessa o sítio do Emerson, ele escreveu mais abobrinhas.”

“Acessa o sítio... mais abobrinhas.”

Tenebrosa combinação.

A sandice, todavia, não pára em site x sítio. Imaginem, estimadíssimos, que querem deletar de nossas vidas até mesmo o verbo deletar!

Absurdo!

Nada mais latino, nada mais puro, nada mais “última flor do Lácio” do que deletar, derivado do latim delere e deletum. Por sinal, o post anterior do Olhar Crônico foi, justamente, Delenda Itaipu. Sendo assim, não vou alongar-me nesse ponto, mas recomendo a leitura ou releitura de “Delenda Itaipu”. Caso queira, aproveite e printe esse texto na sua impressora, mas procure usar papel reciclado. Esse blog, ou site, ou homepage, é a favor do ambiente, de preferência por inteiro e não pelo meio. Portanto, olhos à obra na leitura ou releitura recomendada. Afinal, chove a cântaros nessa sexta-feira meio-feriado e nada melhor que perder tempo com um pouco de abobrinhas escritas por um blogueiro que gosta da língua viva e em constante crescimento, não necessariamente mutação.

Capisce?


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