terça-feira, julho 19, 2005

Em volta de uma fogueira...


O inverno está gostoso, principalmente com uma bonita fogueira, bate-papo animado, pipoca, quentão (pra quem gosta, não é meu caso) e algumas outras coisinhas do tipo gostoso/engordativo.

Antes de ir pra fogueira no vizinho, uma vista d’olhos nas bezerras e nas vacas. As bezerrinhas estão bonitas, tranqüilas, satisfeitas. Deitam em cima do feno que cobre o chão embaixo da aroeira-pimenta. As mais crescidas ruminam tranqüilamente e ficam olhando o visitante iluminado pela luz da lua. As mais novinhas, entre elas dois machinhos, dormem a sono solto, a cabeça enterrada entre as pernas, enrodilhadas. As vacas ficam ao lado, no curral. As mestiças, mais ligadas às crias, deitam-se bem do lado da cerca que separa o bezerreiro da passagem que leva ao curral. É muito difícil a gente ouvir uma vaca ou um bezerro berrando por aqui. Mesmo separando mãe e filho com 4 ou 5 dias de idade. Isso significa baixo nível de stress, o que é essencial quando se produz leite. Olho o feno estragado e meu bolso dá uma pontada. Bobagem. Esse feno está dando conforto pra bezerrada, portanto, não está estragado. Com esse pensamento animador vou pra casa do vizinho.

D, filho do meu vizinho, é adolescente, saindo dos 16 pros 17. Já morou quase 3 anos no Japão, para onde seus pais foram para ganhar algum dinheiro (sua mãe é nissei e o pai é caboclo). C é filho de outro vizinho, tem apenas 10 anos. Morou no sitio sua vida toda, assim como seu pai, que nasceu e sempre morou no sítio. Escuto a conversa dos dois. Discutem “South Park”: episódios, ideologia, qualidade, etc. Palavras como metranca, hd (agá dê), programa, software e outras entram e saem da conversa. Ambos estão revoltados, digamos, porquê ainda não há previsão para instalar a internet via rádio pra gente. A empresa que vai prestar o serviço precisa de mais consumidores para reduzir o custo de instalação. É só o que nos falta, pois todos temos nossas parabólicas com acesso a um monte de canais, temos bons telefones, tanto fixos (eles, eu não), como também celulares de excelente qualidade. Realmente, só falta a internet para estarmos no melhor dos mundos pós-modernos e pós-tudo. Levanto discretamente e vou conversar com os pais deles, ajudar a criticar esse governo imbecil e imbecilizante, pra não entrar com outros adjetivos. Sob nossas cabeças a lua crescente soma sua luz à luz da fogueira. Os cachorros estão deitados, alertas a tudo e, principalmente, a qualquer pedaço de pizza ou carne que sobre pra eles. Mais ou menos como um certo povo bonzinho que conheço.

Foi difícil tirar o guri do Japão, conta sua mãe. Ele não queria voltar de jeito nenhum. Estudava o dia inteiro, gostava da escola, a julgar pela descrição uma maravilha, e totalmente gratuita. Ela mesma também não tinha muita vontade de voltar. Ou melhor, tem, mas de voltar para lá, deixar o Brasil para trás. Difícil dizer algo contrário, não com as notícias que ocupam os noticiários desses tempos que correm.

Mais um pouco e vamos todos embora. Dormir cedo é essencial, pois as vacas e as galinhas levantam cedo. O pai do C não vai dormir. Vai dormitar, pois a cada duas horas e meia precisa reabastecer as caldeiras que geram calor para os pintinhos ainda novos e dependentes de uma boa fonte de calor para sobreviverem. São noites e noites seguidas com essa rotina. Durante o dia, nada de descanso. As outras tarefas, geralmente pesadas e cansativas, não podem ficar para trás, precisam ser feitas. Uma trabalheira terrível. Com sorte, e muito esforço, tudo isso vai gerar uma renda média mensal por volta de dois mil, até dois mil e quinhentos... reais. O problema é que raramente essa média é atingida. O sítio, as duas granjas e a casa, devem valer hoje uns seiscentos mil reais, talvez até setecentos mil. Numa caderneta de poupança com risco zero e trabalho idem, esse valor daria todo mês algo como quatro mil e quinhentos a cinco mil reais. Sem trabalho e sem risco. Mesmo considerando apenas os juros da poupança – meio por cento ao mês – o negócio é muito mais interessante.

Com esse e outros pensamentos vou embora, o sono bateu.


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2 comentários:

Anônimo disse...

tenho muita dó dos pintos e das galinhas de granja

Anônimo disse...

Emerson
Gosto demais de sus comentários na Cora,e toda vez que te visito morro de inveja deste seu lugar.
Um abraço