quinta-feira, dezembro 01, 2005

Vastidões

O sertão, o mar...


Gravei há tempos um episódio especial de CSI, dirigido pelo Tarantino. Tá aqui do lado, sequer mexi na fita, venho adiando o dia de assisti-lo, mas, na verdade, nem sei se vou fazer isso. Por que? Porque a história se desenvolve em torno do seqüestro de um dos personagens, que é mantido aprisionado num caixão. Sinistro, muito sinistro, e esse sinistro nada tem a ver com o uso moderno da palavra, pela rapaziada nas baladas. É o velho sentido mesmo, de tenebroso, assustador, arrepiante. Sou claustrofóbico, definitiva e completamente.

Gosto do sertão pela imensidão que apequena a gente ainda mais. Gosto da paisagem. Pode ser pequena, escondida logo adiante por uma montanha, alimentando uma permanente vontade de ir até o outro lado para ver o que tem por lá. Pode ser a paisagem do espigão onde cresci, o divisor de águas entre o Tietê e o Peixe, correndo no sentido do sol e abrindo um mundo sem fim sempre que olhava pra direita ou pra esquerda. Os altos de Santa Rita do Passa Quatro têm de tudo isso um pouco. Ora você está num vale e uma curva da estrada mais adiante, no contorno de uma montanha, revela um novo mundo pela frente. Ora você está no alto e o mundo inteiro se descortina em muitas direções.

Isso tudo é ainda maior no cerrado, nas grandes chapadas. É muito mais mundo pra olhar e você perdido nele. Há quem ache massacrante, há quem ache fascinante. É nesse time que eu jogo.

É assim, também, nos pampas. Uma lonjura imensa quebrada muito, muito distante, pela mancha escura de um capão de eucaliptos que esconde uma casa. Que protege a casa, é bem verdade, mas é como se a escondesse, para que casa nenhuma, obra nenhuma manchasse a vastidão dos campos. O pampa é um lugar para se andar a cavalo. Nem de carro e muito menos a pé. É do alto de um cavalo que temos a sensação sadia, mesmo que ilusória, de dominar a paisagem. Sem ele, somos dominados e a angústia se instala. O pampa pede um cavalo para o homem, porque só o cavalo com seu silêncio compreensivo dialoga com o homem que mais sente do que enxerga o pampa.

Se não gostasse tanto do campo, de vacas e de cavalos, de pegar fruta no pé e chupar na hora, de espantar uma perdiz de um touceirão de capim ou um teiú de seu banho de sol, de caminhar atrás de horizontes sempre mais adiante, um sucedendo o outro, eu viveria no mar. Talvez vivesse, como já sonhei viver muitas vezes, a bordo de um veleiro, ouvindo o vento e a água, fazendo festa ao avistar ou ouvir uma gaivota, um albatroz. Olhando em volta da crista de uma grande onda e enxergando o vazio aparente, só céu e mar a perder de vista, mar sem fim, céu sem fim. Talvez trabalhasse num grande cargueiro ou petroleiro, e ficaria horas e horas na ponte, olhando mar e céu, de dia e de noite, nas noites sem nuvens e sem bruma, o céu imenso que deve ser mais imenso ainda no meio do Pacífico, no meio do nada, no meio do tudo.

O mar é tudo.

O sertão é tudo.


E eu, definitivamente, sou claustrofóbico, sou “espaço-dependente”. E sou nada.


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Um comentário:

Anônimo disse...

Bonito...