segunda-feira, junho 06, 2005

Segunda-feira, sexto dia do sexto mês do ano da Graça de 2005

Um dia que talvez entre para a história pela via da lata de lixo.

Um dia que talvez vá para o lixo como tantos outros. Simplesmente.

Tudo é possível.

Logo cedo tudo parecia normal em Congonhas. Frio e umidade, catorze graus centígrados, a notícia de Curitiba fechado para pouso e decolagem, gente aos montes, montes de gente, gente saindo pelo ladrão na escuridão de um típico final de madrugada paulistana. E um monte de gente comprando os jornais. Tudo que eu esperava era uma leitura sossegada e gostosa sobre o jogo da seleção. Afinal, futebol é vida e o resto é detalhe. E detalhes, geralmente, nem me interessam muito. Gosto mais da vida. Triste engano.

Roberto Jefferson já estava na Veja que chegou em casa no sábado. Ele e a atrasada Operação Curupira. Não me tiraram o sono, tampouco o humor. Notícias requentadas, mesmo a revista desmentindo declarações do presidente do IRB, nomeado por Roberto Jefferson. E ali, na minha frente, estava a Veja já vista, já lida, já digerida. Ao lado, a Época. Opa! Roberto Jefferson de novo? Sim, de novo. Agora numa história de concessão de rádios para um amigo. Logo duas rádios. Isso me leva a pensar que preciso arrumar novos amigos. De preferência que me dêem rádios, emissoras, é claro. Podem ser de tv, também. Não sou luxento pra essas coisas e acredito que a cavalo dado não se olha os dentes. Apesar dos custos de manutenção de um cavalo hoje. Bom, esse negócio de parlamentar arrumando emissoras de rádio e tv para amigos e para eles próprios via amigos cítricos, também chamados laranjas, é mais véia que andar pra frente. Nem dei bola.

Foi quando meu olhar caiu sobre a Folha de São Paulo.

Ai ai ai...

A manchete trazia... ele, sempre ele: Roberto Jefferson. Confessando a existência do mensalão. Dizendo ter contado isso ao presidente. Da república. O próprio, o que foi eleito por mais de 50 milhões, etc e tal. Há meses, já. Vários meses. Disse mais: depois de dizer que os ministros do presidente só faltaram ajoelhar-se perante ele, disse que sua declaração provocou o choro do presidente.

Como esse Roberto Jefferson é poderoso!

Ao saber que seu partido pagava trinta mil por mês aos deputados, esse é o famoso mensalão, o presidente chorou. Até eu choraria. Aliás, já estou choroso. Trintinha todo mês faria um bem danado pra mim e pra minha família e pras minhas cachorras e pra minha gatinha e pras minhas vacas e bezerras e galinhas. Nossa, com trintinha eu seria um cara feliz. Dizem que dinheiro não compra felicidade, mas experimenta esfregar trintinha todo mês no nariz da tal felicidade. Experimenta...

Bom, porquê o partido do presidente era tão generoso com os deputados é uma pergunta simples de resposta ainda mais simples. Passo.

A pergunta é outra: de onde o partido do presidente tirou tanto dinheiro? Trintinha por mês vezes um monte de deputados, todos da base, todos fiéis, todos sedentos por trintinha e mais trintinhas...

Cercado por um monte de Robertos Jeffersons, na banca e nas mãos de passageiros como eu, fui pra sala de embarque esperar o tempo abrir em Curitiba. Normal. Tempo fechado em Curitiba e tempo feio em Brasília. Normalidade como filme de sessão da tarde: é repetida todo mês, todo ano, todo governo. Ninguém troca o filme. Ninguém corrige o filme. Ninguém, talvez, se incomoda mais com filmes repetidos. Então, pode ser que esse sexto dia do sexto mês do ano da Graça de 2005 entre para a história pela sua porta dos fundos, a porta do lixo. Mas pode ser, também, que esse dia simplesmente vá pro esquecimento. A gente não dá bola pra filme repetido. Deixa a imagem na tela e continua conversando ou lendo o jornal ou fazendo palavras cruzadas. O filme repetido é apenas uma decoração passageira que não incomoda. Compõe o pano de fundo de nossas vidas.


.

Nenhum comentário: