segunda-feira, setembro 24, 2007

São Paulo, Comes & Bebes...

... e a Padaria 14 de Julho

O saco plástico com a Veja de sábado chegou pesado e mais volumoso que o normal. Também, pudera, a “Vejinha” estava com cara de catálogo telefônico, não só no peso como no visual, com lombada quadrada, formato de impressão que permite produzir revistas com maior número de páginas. E essa edição caprichou: nada menos que 436 páginas!

- Nossa, mas existe tanta notícia assim? – pergunta o desavisado leitor que não mora nessa megalópole. Sim, há tanta notícia para muito mais, até, só que não é o caso. Essa é a edição anual “Comer & Beber” da Veja São Paulo. Nada menos que 500 (quinhentos, por extenso só para garantir) restaurantes e 250 bares, fora outros 250 lugares para o que eles chamam de “comidinhas”. Essa, que ninguém me ouça, é a melhor parte da lista, com certeza. Lugar de sanduíches maravilhosos, desde um simples cachorro-quente ultra-gostoso e meio requintado, até o nosso tradicional, tradicionalíssimo bauru, passando pelo sanduíche de pernil da 14 de Julho. Sanduíche? Melhor chamar de refeição para dois. Esse pernil é simplesmente maravilhoso, assado no vinho por 14 horas, e com ele preenchem meio filão de pão italiano. Bom, eu como bem, basta ver a fotinho meio defasada para se ter noção de tal fato. Pois bem, apesar disso, parei na 14 de Julho dias atrás na hora do almoço, entre uma reunião e outra. Estava com fome, pedi um sanduba de pernil. Olhei pra cara do bitelo quando chegou e engoli em seco; comi, comi, comi, e o balconista embrulhou metade, que foi o meu jantar. Tudo isso por meros oito reais e setenta centavos. Pouco menos de cinco dólares. Só em São Paulo, mesmo.

Mas a 14 de Julho é infinitamente mais que mera parada para comer um sandubão. É um lugar histórico e de histórias. É um lugar de tentações, ah, sim, é lugar de muitas, muitas tentações. É histórico porque a padaria já tem 110 anos de idade. Foi fundada em 1897, ainda no século XIX, quem diria! No mesmo lugar, o que é mais incrível ainda. O Nono Franciulli entregava o pão para a freguesia de carroça. Aliás, peguei essa fase do pão vendido em carroça. No bairro em que meus pais moravam, o Ipiranga, o carroceiro era um português que passava cedo. A carroça era sofisticada, era uma “carroça-baú”, os pães ficavam lá dentro, protegidos e frescos. Dia de festa era quando o dinheiro de algum vestido que minha mãe fazia permitia a compra de um sonho.

Sonho é aquela coisa com que você sonha durante dias ou semanas, até meses ou anos, e de repente lá está ela em sua frente: uma bolota de massa frita, coberta por uma crosta escura, recoberta de açúcar de confeiteiro por sua vez e, suprema delícia, recheio de creme. Há quem goste de outros recheios. Bom, há gosto para tudo, claro, e eu, digamos, respeito, embora lamente. Sonho é isso. Morando mais na fazenda com meus avós, do que em São Paulo com meus pais, uma de minhas lembranças e vontades da casa paterna era o sonho. Freud deve explicar, acho.

Nunca moramos sequer perto do raio de ação geográfico e temporal da carrocinha da 14 de Julho. Sua descoberta, para mim, foi tardia, já nos anos 90, seguida de paixão à primeira mordida pelo pão italiano, pelo pão recheado com lingüiça – esse, um terrível indutor do pecado da gula – e por issos e mais aquilos, tudo, tudo mesmo sobrepujado pelos avassaladores cannoli.

Lembro do cannoli e minha boca enche-se de água. Tem um filme, não lembro qual, em que um chefe mafioso novaiorquino é louco por cannoli, e presenteia quem ele gosta com um pratinho deles. Mafiosos também têm bom gosto. Trata-se de um canudo de massa folhada assada, preenchido com creme. Há quem prefira o recheio de chocolate; eu entendo, claro, mas não deixo de lamentar, claro, também. Por cima, o bendito açúcar de confeiteiro. Cannoli é creme, para mim. Cannoli é uma dádiva sobre a qual você fecha os dentes, corta um pedaço de massa cuja única função é proteger e segurar o creme e, então, se delicia com uma das grandes descobertas do gênio humano.

Cannoli, sanduíche de pernil, pães, tudo isso é somente parte de algo muito maior. O teto é tomado por salames, queijos e lingüiças pendurados. As laterais tem de tudo um pouco e, logo à entrada, tenebrosa mesa coberta por variados antipasti; e bota variados nisso. Tem massas frescas, que podem ser feitas na hora e aí basta chegar em casa, pegar o garfo e mangiare. Tem bracholas e porpetas, claro, mil coisas com berinjela (outro dia compramos um pão recheado com berinjela que estava absolutamente irresistível, a ponto de ter comido parte dele no carro, dirigindo pela megalópole), azeitonas e outras coisas. A lista de delícias é extensa demais para tão modesto blog.

Ah, mais uma coisa antes de terminar: essas fotos são, mesmo, da padaria. Eu mesmo tirei-as. Pois é, nem parece, né? Nada das luzes e amplos espaços dos tais “templos” de comida de hoje em dia. Essa padaria que as fotos mostram é, basicamente, a mesma e do mesmo jeito que era em 1897.

E, antes que me esqueça, lembra do cannoli? E do chefe mafioso? Pois é...

O nome do cannoli é cannoli siciliano.

Buon apettito!


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3 comentários:

Anônimo disse...

muito simpatica sua descrição da loja.A massa do cannoli siciliano e frita e o recheio e de creme de ricota com pedacinhoos de frutas citricas cristalizadas e chocolate em cubinhos,polvilhado com açucar de confeiteiro e decorado com finas tiras de casca de laranja ou limão.sheila

Anônimo disse...

Pelo amor de Deus, Emerson, endereço?!?! Vou pra Sao paulo na terça.

Emerson disse...

Anônimo, aí está, pelo amor da boa comida - :o) :


Padaria 14 de Julho

* Endereço Rua 14 de Julho, 92
* Bairro Bela Vista
* Tel. (11) 3105-3215
* Estacionamento

o Horário 7h/20h30 (dom. até 18h; seg. 12h/20h)


Divirta-se.
:o)

E não deixe de passar pelo Mercado Municipal. Tem posts a respeito aqui no blog.