Dias atrás meu irmão veio nos visitar. Depois de longo tempo desempregado, conseguiu voltar ao Ceasa, trabalhando na venda de peixes durante a madrugada. A empresa para a qual trabalha compra os peixes que vêm do Sul e do litoral próximo de São Paulo e revende-os aos varejistas. Como nunca vem de mãos vazias, dessa vez trouxe algumas anchovas muito bonitas. E muito, muito deliciosas. Acabei de saborear o que sobrou da última agora, assada com capricho, sem tempero algum, exceto um pouco de sal, azeite e, gosto meu, limão por cima dela já pronta. Anchova tem sabor próprio, pronunciado, gostoso, assim como o salmão e a truta. Colocar temperos nesses peixes é, para mim, puro desperdício de tempo para preparar e de ingredientes que poderiam ser usados em outras coisas. Aliás, são raros os peixes que gosto de comer com temperos & similares. Para mim, basicamente, peixe é frito, grelhado ou assado, e só limão pode entrar na brincadeira. E entra. No mais, gosto de uma ou outra moqueca e caldeirada, mas...
Bom, mas não é por isso que estou escrevendo esse texto. As anchovas estão ótimas e abundantes esse ano, um tanto atípico, até. As tainhas estão abundantes, também, e boas, mas seu futuro imediato não é brilhante. Ainda há poucos dias, muitas toneladas delas simplesmente perderam-se
Pior ainda, meu irmão comentava sobre o crescimento da comercialização de ovas de tainha e de qualquer coisa que nade. Um verdadeiro crime. Muitas vezes o peixe sequer é aproveitado, apenas suas ovas. Crime pra pegar cadeia. Recuso-me a comer ovas de peixes. A menos que tenham origem em criatório, coisa que não acontece, pois tainhas são “do mar”. Sendo assim, não como, simplesmente. É o mínimo que se pode fazer. Parece que o Extremo Oriente é o destino para boa parte dessas ovas, assim como é das barbatanas de tubarão.
Naturalmente, meu irmão queixou-se da situação. O fornecimento de peixes está muito reduzido. Conseqüência direta das reduções de estoque provocadas pela pesca desenfreada. Quando ele começou no Ceasa no final dos anos setenta, o número de caminhões que chegava toda madrugada era enorme. Ele trabalhava um bocado e ganhava muito bem, tanto que conseguiu comprar um belo apartamento, além de carro e de sua paixão, uma moto imponente com a qual transformou-se
Um verdadeiro Abutre (tribo urbana de motoqueiros, a maior do Brasil).
Hoje, contudo, o peixe é pouco e o dinheiro que dá para ganhar não basta para as despesas mínimas da casa. Se sua companheira não trabalhasse, também...
O Atlântico Sul não é o pior dos cenários nessa história. A coisa está feia para valer no Atlântico Norte, onde o bacalhau caminha para a extinção, e nas áreas de pesca do Pacífico, também com várias espécies sumindo. Entre elas o peixe preferido dos japoneses, o atum-azul.
E à medida que esse magnífico animal desaparece, seu preço explode e um único exemplar, em 2004, chegou ao preço de US$ 200,000.00! Como ele pesou
Bom, essa loucura por sushi – e eu me confesso pecador nesse caso (alô revisão, pecador e não pescador, ok?) – é o que explica a maior parte de sua rápida desaparição.
E assim vamos caminhando sobre nossas duas pernas – por falar nisso, trabalho interessante de pesquisadores da Universidade da Califórnia, liderados pelo Dr. Michael Sockol, descobriu que a origem do bipedalismo, o nosso caminhar sobre duas pernas, deve estar associado ao menor consumo de energia requerido em relação ao caminhar sobre quatro patas – e fazendo tudo errado, destruindo o que encontramos pela frente. E seguimos nos multiplicando aceleradamente. E os que não mais se multiplicam, talvez em função dos confortos excessivos, que sei eu, aumentam... seu conforto e seu consumo de prazeres. E segue a destruição, mas a vida vai bem, obrigado.
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Um comentário:
Emerson,
Veja aqui o site da Slow Fish -- afiliado ao Slow Food -- que versa sobre tais assuntos relacionados à pesca sustentável...
http://www.slowfish.it/welcome.lasso
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