sexta-feira, julho 27, 2007

A guerra dos beija-flores

Não gosto de esteira, a menos que possa exercitar-me assistindo à televisão. De preferência com um programa esportivo. Simplesmente andar numa esteira é coisa chata demais, embora saudável.

Da mesma forma não gosto de academias. Mesmo que a paisagem interna tenha atrativos interessantes... Com todo o respeito, é claro, afinal, sou moço sério.

Bom mesmo é caminhar. Para quem tem a sorte de à beira-mar morar, caminhar pela praia bem cedo ou no crepúsculo é uma delícia e é atividade sempre interessante, porque na pior das hipóteses tem aquele marzão besta de grande pra olhar. E o mar é algo que a gente nunca se cansa de olhar.

Por aqui, caminho pelas ruas da Fazendinha, bairro da Granja Viana recheado de casas e condomínios. E com muito verde, ainda, apesar do construir incessante por suas ruas. E a cada casa que se ergue, um pedaço de verde, um pedaço de mata ou capoeirão, encontra seu fim. É o progresso.

Mas o povo que ergue as casas costuma plantar novas árvores. Um deles plantou cinco ou seis pés de unha-de-vaca, ou pata-de-vaca, nome que lhe é dado por causa do formato de suas folhas. Ela também é conhecida como bauínia, aportuguesamento chique de seus nomes científicos, Bahuinia forficata – nativa do Brasil, de flores brancas – e B. variegata, nativa da Ásia (Índia, Burma), de flores cor-de-rosa a arroxeadas. Há outras bauínias, igualmente exóticas, mas essas duas são as mais comuns.

Uma das coisas boas das patas-de-vaca, além da beleza, é o fato de serem muito apreciadas pelos beija-flores. Indoutrodia fiquei olhando um deles no haras da Mônica, em Santa Rita do Passa Quatro, e até tentei fotografá-lo, mas o danado escapuliu. Aqui na Fazendinha, já terminando meu circuito de caminhada de 8 quilômetros, a cada dia mais demorado por causa das paradas para as fotos, ouvi o zunir de objetos voadores em alta velocidade. Não, não, felizmente não eram balas perdidas, e sim beija-flores em briga, um perseguindo o outro, espantando-o de seu território. E o bichinho deve ter os olhos maiores que a barriga, pois se não consegue dar conta sequer das flores de meia pata-de-vaca, não deixa por menos e é senhor absoluto de nada menos que quatro pés dessas árvores, todos carregados de flores. Isso é o que se pode chamar de um senhor estoque de alimentos, despensa de respeito até pelos padrões das casas senhoriais do Brasil Colônia. Eles voam em alta velocidade e com uma agilidade impressionante. Dado o carreirão no intruso, o senhor das árvores volta para seu pouso predileto e fica por ali, vigilante.

As cenas de perseguição lembram-me os relatos de batalhas aéreas protagonizadas pelo Barão Vermelho, o ás alemão da I Guerra, e, mais ainda, as lutas encarniçadas entre os Spitfire ingleses e os Messerchmit Me 109 alemães durante a Batalha da Inglaterra, na II Grande Guerra. Essa luta desenvolveu-se ao longo de 1940 e 41, diminuindo de intensidade a partir de 42 e sendo substituída mais adiante pelas “bombas-voadoras”, os foguetes V1 e, principalmente, a temível V2, o primeiro míssil da história, precursor dos ICBM americanos, russos e chineses. Foram os pilotos da Royal Air Force que, mesmo em número menor, conseguiram impedir a destruição de importantes indústrias e usinas, além de quartéis e portos, mantendo as tropas nazistas no continente, sem condições de cruzarem a Mancha e invadirem as Ilhas Britânicas. Sobre eles, Churchill disse uma de suas mais famosas frases:

- Nunca tantos deveram tanto a tão poucos.

Bonita frase, forte, significativa, pronunciada em discurso no Parlamento, mais conhecida por essa forma reduzida, mas que, completa, é:

“Nunca, no campo das lutas humanas, tantos deveram tanto a tão poucos.”

No Brasil essa frase não tem muita força, pois já estamos cheios, lotados ao máximo por quase infinitas frases na linha do “nunca esse país isso, nunca esse país aquilo” ou “nunca um governo isso, nunca um governo aquilo”, “nunca se cresceu tanto” e por aí vai.

De volta aos beija-flores.

O senhor das árvores levanta vôo e vai se alimentar. Visita algumas flores, vai para outra árvore, repete as visitas, volta para seu galho predileto e fica ali, à espreita. Que nenhum outro colibri se atreva a entrar em sua despensa.

E com essa visão, guardo a câmera já sem bateria, e saio caminhando e pensando que estadistas como Winston Spencer Churchill não mais existem.

E justamente agora precisamos de um como ele num certo palácio brasiliense.


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