sábado, junho 16, 2007

Um dia perfeito


Um dia perfeito, simplesmente.

O céu está cinza, ora mais, ora menos. De vez em quando cai uma garoa fina e gelada. Em outros momentos é uma brisa que surge e traz com ela um reforço na sensação de frio pela janela aberta. Há um sossego envolvendo tudo. Comer fica mais gostoso, o prazer aumenta ou simplesmente, para muitos, aparece. Comer bem puxa a vontade de uma bebida, um vinho, por exemplo. Depois da refeição não há como fugir de um café quente. E vem a vontade de relaxar, descansar, deixar o mundo e a vida seguirem seu ritmo preguiçoso de uma tarde de sábado de inverno, ainda num final de outono em que o frio chegou mais cedo, se fez presente como sempre deveria ser, desde o começo dos tempos.

Desde o começo dos tempos...

Quantas vezes lemos ou até escrevemos algo assim e tomamos como certo que tudo foi, é e continuará como nós conhecemos, como nós vivemos, apenas com os acréscimos do mercadinho na esquina, uma casa nova onde antes moravam os caxinguelês, um predinho acolá, onde um senhor de grande bigode branco caindo pelos lados da boca, como aqueles mexicanos do cinema, soltava meia dúzia de vacas com seus bezerros. Fora isso, e o asfalto que finalmente chegou na porta de casa, tudo era igual sempre, desde o começo dos tempos. Bom, algumas árvores foram derrubadas aqui e ali, mas outras, domesticadas, foram plantadas e cresceram.

É, pensando bem, tudo isso já não tem a mesma cara desde o começo dos tempos. Mas a gente nem percebe, vai vivendo o dia-a-dia e aceitando tudo como natural, como parte do progresso, como uma evolução permanente, como se pudéssemos medir a vida numa régua numerada começando em menos dez e indo até mais trinta ou até o infinito. Não entendemos, mas gostamos dessas grandes noções como infinito, como desde o começo dos tempos, como para sempre...

Essa é uma das coisas que nos faz diferentes, com toda certeza. Mas não impede que todos esses grandes conceitos que povoam nosso imaginário sejam ameaçados, banalmente ameaçados, porque queimamos mais coisas do que jamais poderíamos queimar. Queimamos energia demais apenas para nos mantermos gordos e cheios de energia não aproveitada.

E agora tento esquecer essas coisas incompreensíveis, como o começo dos tempos, o para sempre, a evolução não se sabe para onde e porque, e limito-me a ver, sentir e pensar que eu gosto das mudanças, gosto da passagem do verão para o outono e deste para o inverno. Logo gostarei e estarei esperando pela primavera, pelas chuvas, pelo verde, pelas flores, pela explosão de vida por toda parte.

Estou com medo de perder tudo isso, estou com medo de ver as mudanças cíclicas terminarem e darem lugar à monotonia cansativa e mortal do calor, à angústia da seca, à tristeza da falta de vida e vivacidade que as mudanças trazem e estimulam.

Nesse momento, eu sou um homem com medo.

E já tenho saudades desse dia perfeito que estou vivendo.


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Um comentário:

Anônimo disse...

EMERSOM;APARECE NA CORA;PLIS!