As chuvas assustam.
As manchetes gráficas e eletrônicas estampam “50 mortes” provocadas pelas chuvas, inclusive no exterior.
Chuvas provocam a maior enchente da cidade de Campos.
Quase seis mil desabrigados, só no estado do Rio de Janeiro.
Congonhas fecha por causa da chuva e São Paulo tem mais de dez pontos de alagamento.
E por aí vai, um imenso rosário de tragédias e tristezas, grandes e pequenas.
E as pessoas saem a desancar a chuva, jogando sobre ela a responsabilidade sobre todos os males, senão do mundo, pelo menos do Brasil.
E eu aqui, no meu cantinho, fico constrangido em bendizer a chuvarada, chegando, quando muito, a desejar apenas que ela se distribuísse um pouco melhor, sem tanta concentração e força em períodos tão curtos.
Mas...
Por que ficar constrangido?
Desde quando a chuva é culpada pelas desgraças e tragédias humanas?
O próprio dilúvio, segundo a Bíblia, nada mais foi que uma grande ação de limpeza divina, uma lavagem em regra da casa que estava muito suja.
Aqui, na Terra de Vera Cruz, creditar à chuva as tristezas que hoje vemos nos jornais e telinhas, é absolver e justificar autoridades relapsas e pessoas ignorantes ou descuidadas.
A ação destruidora das águas não é novidade para ninguém, nunca foi. A água é agente transformador do relevo, podendo operar em pequena escala, como no sulco no meio do pasto, ou em grande escala, atrainda milhões de turistas, como o Grand Canyon. Diz o bom senso que não é bom ficar no caminho das águas. Todavia, quem disse que o bicho-homem tem bom senso? O que vemos em nossas cidades?
Construções, inclusive de alto luxo, em encostas de morros, frágeis como um castelo de areia na praia.
Grandes avenidas e construções infindáveis ocupando as beiras de rios e córregos, áreas que existem com a finalidade principal de abrigar as águas excedentes das épocas de chuva.
Construções e asfalto a perder de vista, cobrindo todo e qualquer centímetro quadrado de terra, impermeabilizando enormes áreas, impedindo a água das chuvas de seguirem seu rumo natural e desejável, que é adentrar o solo e ficarem depositadas mansas e ordeiras no lençol freático e nos grandes aqüíferos, mais profundos.
A tragédia de hoje nada mais é que o resultado normal e esperado do erro de ontem e da omissão de sempre das autoridades.
Em nome do “social”, nada se faz para impedir que pessoas pobres e desesperadas construam casas e barracos nos morros e várzeas.
A expansão desordenada das cidades e a busca por mais e maiores lucros imobiliários, transformam várzeas em bairros residenciais, comerciais, industriais...
Agravando esse quadro ainda mais, as matas foram devastadas e a agricultura praticada em lugar delas é destruidora de solos. Sem condições econômicas para cuidar bem da terra, sem assistência técnica e incentivos para fazer isso, o agricultor comum, mormente o pequeno, deixa seu precioso solo arável escorrer para córregos, riachos e rios.
E, ano após ano, tudo isso se repete, sem novidade.
E, ano após ano, toda a culpa é jogada sobre as chuvas, sobre o clima, sem novidade, tampouco.
E, ano após ano, nada é feito para corrigir e evitar. Como de hábito.
Em 2008 estaremos falando dessas mesmas coisas. Tal como fizemos em 2006, 2005, 2004, 2003...
Tudo por culpa da “marvada” chuva.
Um adendo
A chuva, por pior que seja, é sempre um evento de ação restrita, localizada, ao contrário da seca, que é difusa, atinge amplas áreas, desconhecendo fronteiras e barreiras. Só para registro.
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5 comentários:
Concordo plenamente com vocë. [E f[acil culpar a chuva e esquecer toda essa ocupa;áo desenfreada que piora a cada ano. Depois [e s[o culpar a chuva e náo perceber que as casas que caem ou sáo as mesmas ou as do lado delas. Mas enquanto houver um culpado...Abra;os, Maria Helena
Concordo plenamente com vocë. [E f[acil culpar a chuva e esquecer toda essa ocupa;áo desenfreada que piora a cada ano. Depois [e s[o culpar a chuva e náo perceber que as casas que caem ou sáo as mesmas ou as do lado delas. Mas enquanto houver um culpado...Abra;os, Maria Helena
Desculpe a gaguejada e os erros, estou brigando com esse teclado novo mas perto do final do ano nos entenderemos.
E como tudo isso é antigo, Maria Helena!
Minha mãe fica apavorada com qualquer chuva, apesar de minha casa estar localizada numa meia-encosta, sem risco algum. Mas os traumas de muitas enchentes no comeco dos anos 50 perdura até hoje.
Aliás, por conta de uma enchente eu fui despachado, bebê ainda, pra fazenda, onde fiquei com meus avós e que acabou tornando-se meu segundo, ou primeiro, lar, e moldou minha vida toda.
Oi. Tô vindo do blog da Cora e gostanto dos comentários de seu dia-a-dia na roça. Sou de Petrolina/PE (sertão pernambucano)e como você tenho uma afinidade atávica com a chuva. Quando chove por aqui, o que não é muito frequente, vou para a janela admirar e fico encantado (e o "cheiro", que maravilha - sei que não é da chava, propriamente dita, mas das flores das plantas). Sei que a falta de chuva, em qualquer região, atrapalha quem vive da agricultura-pecuária. Mas a gravidade da seca para a caatinga é muito pior: É o fim da cultura de SUBSISTÊNCIA e a fome e miséria para parcela significativa das famílias que vivem no sequeiro. E aí, eu não sei se o JORNAL NACIONAL informa o fato aos brasileiros do sul-maravilha ou se dramatiza-aterroriza o que por se só já é trágico.
Prá encerrar: Não é que alguns esnobes produtores de fruticultura irrigada (acho que eles não gostam de ser chamados de agricultores e sim de "produtor de uva", "de manga", de preferência "para exportação" que é mais chique) comentam que a chuva atrapalha suas atividades e que melhor seria se não chovesse !!!
Abraços.
l_dias_ferreira@uol.com.br
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