sábado, maio 24, 2008

Notícias do lado de lá do planeta


(Ora, o planeta é um globo, portanto não tem lado, mas quem liga pra isso?)

“...estamos no meio da selva de Java (Grajagan, lembra da foto do por do sol?!) - uma loucura! Essa aventura é para apenas UMA vez na vida! Aqui é jungle mesmo, animais, floresta, mar, e até pessoas...

Mas é uma experiência muito bacana de vida”

O e-mail, curto como os outros, é da minha filha, Carolina, que com o marido anda por Bali, Mentaway, Grajagan, Kuta, nas águas e terras da Indonésia. A caminho de casa, farão mais uma parada, dessa vez na África do Sul, para mais ondas numa praia também famosa pelas visitas dos tubarões brancos. Em outro e-mail ela disse que as ondas são “animais”. Num outro, espantada com a quantidade absurda de turistas em Bali e região, disse que se tivéssemos um terço daqueles turistas nessa Terra de Vera Cruz, ela e o Rodrigo seriam ricos e iriam surfar em Bali & adjacências todo ano.

Eis uma hipótese que não me agrada em nada: eles em Bali & adjacências todo ano.

Cresci lendo e assistindo filmes – lembram de Krakatoa, o Inferno de Java? – rodados (ou não) naquelas montanhas e águas, povoadas por vulcões e caçadores de cabeças. Os primeiros andam adormecidos, felizmente, enquanto os segundos simplesmente espalharam-se por muitas partes.

Desde que eles viajaram, logo depois do ciclone sobre Burma, ou Myanmar, como querem os assassinos uniformizados que dominam o país, olho mais preocupado que o normal para tudo que acontece por lá. Enquanto ainda segue a contagem das vítimas e os órgãos internacionais de socorro humanitário tentam permissão – conseguida a duras penas, com muitas restrições – para entrar no país, acontece o terremoto em Sichuan, terrível, quase 8 na escala Richter, logo seguido por outro, menos intenso, mas que também provocou mais mortes e danos.

Não bastassem os cataclismas naturais, agravados pela insânia humana, essa última se revela agora em toda sua bestialidade, em plena África do Sul, onde os pobres e miseráveis perseguem, torturam, estupram e matam das formas mais cruéis outros pobres e miseráveis. Tudo por causa de emprego, a disputa por poucas vagas de trabalho e míseros salários, insuficientes para nada mais além da mais precária sobrevivência.

A cada novo ano que entra, a cada novo ano que acrescento aos que já vivi, aumenta minha vontade de ficar recolhido ao meu ninho, minha toca, meu buraco. Não sei se isso é conformismo, medo ou comodismo, ou somente preguiça, é um prazer cada dia maior simplesmente ficar em casa, seja na Granja, seja no Sítio, e conviver com as coisas que me são caras.

De certa forma esse desejo é alimentado pelo fato do mundo estar à minha frente todo dia, toda hora, como, por sinal, nesse momento em que escrevo. Acabei de deixar para trás a edição digital do New York Times de hoje. Não perdi tempo lendo sobre a insana batalha de Hillary contra Obama. Bobagem, dará Obama e ponto, quanto antes melhor, na indicação democrata. Depois, contra McCainn, a história será outra, provavelmente com o mesmo final: Obama. As minúcias do dia-a-dia dos três já não me interessam, ao contrário da manchete do NYT: 270 imigrantes ilegais condenados.

A administração Bush parece um tormento sem fim. Já falei antes e repito: nela, o que abomino e deixa-me amedrontado, não é sua sanha intervencionista em outras nações, ao fim e ao cabo limitada ao Iraque (o Afeganistão foi outra história, na minha opinião), mas sim a sua sanha intimidatória e repressora dentro dos Estados Unidos, contra cidadãos, tanto americanos como, principalmente, estrangeiros. O rigor da Imigração contra os ilegais no país recrudesceu. De maneira geral, esse tipo de ação agrada às massas, historicamente.

Esse caso, por exemplo, é típico: as autoridades fizeram um raid, ou blitz, no estado de Iowa, e somente num grande frigorífico prenderam 389 trabalhadores. Desses, nada menos que 270 foram condenados a 4 meses de prisão, após declararem-se culpados. Caso não o fizessem, seriam julgados por uma coleção de outros crimes, cujo resultado seria uma pena mínima de dois anos de detenção. O dramático, perigoso, assustador e verdadeiramente criminoso nessa história toda, é que tudo isso aconteceu em 4 dias. Apenas e tão somente quatro míseros dias. Os ritos processuais foram atropelados em velocidade de Formula 1. Ou de NASCAR, para ficar dentro do gosto americano.

Contra esse rigor policialesco seguido pela administração sumária da justiça, muitas vozes, as mais diversas, ergueram-se contra, mas são vozes liberais, logo, contam menos que desejável. Essas medidas dignas de estados policialescos, como a ditadura instalada em Burma, não se aplicam somente contra estrangeiros, mas também contra cidadãos americanos – claro que, novamente, com maior rigor e freqüência contra aqueles que, mesmo americanos, têm sobrenomes que não são tradicionalmente anglo-saxões.

É isso que me assusta nesse governo infeliz para o país e o povo americanos, e para a humanidade como um todo. Nesse momento, se há um país para o qual não tenho a menor vontade em voltar, apesar da paixão por muitos de seus lugares, é justamente os Estados Unidos. Será diferente com Obama ou McCainn? Duvido. Ou melhor, sim, haverá diferenças, mas nesses casos eu tenho sérias dúvidas que um ou outro desfaça as armações perpetradas pela administração Bush.

Segue a vida, e do outro lado do mundo Carolina informa que passaram uma noite em Jacarta, a caminho de Kuta e dali para Mentaway, em busca de novas e melhores ondas, uma mais perfeita que a outra.

Precisamos todos de novas e melhores ondas, e que uma delas leve George W e sua tralha fundamentalista para o lixo da história.


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