Não tenho mais por onde fugir.
(E se você, leitor paciente, já fugiu desse texto iniciado com um “não”, não se preocupe, não irei reclamar de sua ação; sim, não irei porque sei que não se começa um texto com não).
Os argentinos descobriram-me, agora o jeito é ceder e embarcar. Aguardo apenas a passagem e a confirmação da suíte no hotel buenairense de minha escolha, pois o congresso acontecerá na linda capital portenha, embora eu preferisse, mesmo, que fosse na muito mais linda San Carlos de Bariloche, no fantástico Lau Lau. Porém, aprendi em outras eras que a cavalo dado não se olha os dentes. Hoje, contudo, dado o preço do feno, das vacinas, das rações e outras coisinhas mais necessárias ao bem-estar eqüino, não só é o caso de olhar-se muito bem os dentes, como também de pensar bastante a respeito de tal presente. Os custos atuais estão fazendo de todos os simpáticos e maravilhosos cavalos... cavalos de Tróia. Nem por isso, entretanto, abrirei mão de manter o Brioso comodamente instalado no Sítio das Macaúbas, além do que, tão logo me mude, darei a ele a companhia de um ou dois parceiros de pasto & feno. Cavalo é paixão e paixão não tem preço. Tal e qual as minhas vaquinhas.
Os argentinos... Pois é, os hermanos descobriram meus pendores para a arte médica e meus profundos conhecimentos a respeito, associados ao gosto que tenho pelas causas jurídicas que rendem grandes debates nos tribunais, chegando, inclusive, à Suprema Corte.
Ah, vocês desconheciam essas minhas facetas?
Pois não deveriam.
A prova está no convite que recebo a cada oito ou dez dias, lembrando-me, instando-me, mesmo, a participar do VII Congreso Argentino de Derecho Médico y de Salud, a realizar-se brevemente em Buenos Aires.
Não, nem adianta pedir-me consulta médica ou jurídica. Apesar do convite para o Congresso citado, não sou médico e menos ainda jurista. Esse último menos ainda tem sua razão de ser, uma vez que, em relação ao primeiro, como diz o povo, de médico e de louco...
Apesar de ser um sem-diploma na vida, e já em dúvida se o meu diploma da vida é verdadeiro ou veio da China via Ciudad del Este, sou um perito nessas artes, como já disse. Consegui chegar onde cheguei graças ao inestimável aprendizado com os Doutores Gregory House e Alan Shore.
O primeiro, para quem não conhece, médico de grande prestígio entre o povo dos Estados Unidos e do Brasil, mas aqui somente entre os felizes espectadores das tevês a cabo. Dr. House tem muito prestígio, também, entre as classes dos artistas e publicitários. O segundo, o Alan Shore, é advogado de enorme prestígio em Boston, terra de grandes juristas de tradição liberal.
Estamos juntos toda semana, eles na telinha e eu no sofazão, e dessa forma damo-nos muito bem.
Sou craque
Como o Alan, sou liberal e conservador ao mesmo tempo. Gosto de velhos valores (ainda mais se ao portador e penhoráveis), mas apego-me ao seu espírito, não às suas letras, pois também gosto das coisas novas. Sou novidadeiro, se alguém quiser me conquistar é simples: um McBook com 4 gigas de memória RAM, HD de 200 gigas, todo equipado com tudo de direito e muito mais. Taí um negócio simples e que, certeza absoluta, conquista-me totalmente.
De alguma forma a organização do VII Congreso Argentino de Derecho Médico y de Salud descobriu-me e às minhas qualificações. Os vendedores de livros já conhecem meus gostos e enviam-me tentadoras propostas literárias, tão tentadoras quanto as propostas de mirabolantes viagens por todo o mundo. Por sinal, trabalho mal empregado, pois de todo o mundo só interessam-me, a rigor, a Toscana, a Provence, as estepes da Ásia Central, o Himalaia, o Kilimanjaro e a Grande Barreira de Recifes, além de ver ao vivo e a cores alguns grandes jogos
De tudo que recebo em minha caixa de entrada internética, tenho ficado incomodado somente com repetidos, inumeráveis e originalíssimos e-mails que me prometem mais
Um verdadeiro absurdo, principalmente se lembrarmos que a formosa Marta Rocha perdeu o cetro universal porque tinha
Eu, hein?
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