segunda-feira, janeiro 30, 2017

Uma jornada muito longa, trabalhosa e cansativa


O editorial da Folha de S.Paulo de hoje é perfeito e já diz tudo em seu título:
“Jornada longa”
E seu fechamento não fica atrás em matéria de perfeição da descrição do que vivemos:

“A destruição das contas públicas, por incompetência e rapinagem de quem esteve no poder na última década, atingiu proporções inacreditáveis. Arrumar a casa levará tempo e exigirá coragem e liderança raramente vistas no cenário político brasileiro.”



Vou fazer um paralelo: um cavalo atleta, desses maravilhosos preparados para as competições hípicas, inclusivo Jogos Olímpicos, é um organismo muito sofisticado em termos de cuidados, começando pela alimentação e terminando com a carga diária de exercícios.

Também sofisticada, nesse sentido, é uma vaca leiteira de alta produção, com seus 45, 50, 55 litros de leite por dia (não, não tenho, não é minha praia). Para vocês imaginarem como trabalha seu organismo, vai uma informaçãozinha: a geração de 1 litro de leite demanda a passagem de cerca de 500 litros de sangue pelo úbere da vaca. Isso mesmo: quinhentos litros. Uma produção de 50 litros, portanto, exigirá a passagem de 25.000 litros de sangue pelo úbere da coitada.
25.000!
Barbaridade...


Ora, se essa vaca e esse cavalo forem deixados meio que ao deus-dará ou, nem tanto, mas os cuidados com eles não forem seguidos à risca, seus organismos ficarão depauperados em curtíssimo tempo.
Menos de 30 dias.

Se nada mais grave acontecer e os cuidados forem retomados tal como antes...
Bom, se simplesmente forem retomados a recuperação, se acontecer (e raramente acontece), será muito demorada.

Se todos os cuidados forem retomados e acompanhados por medidas extras para facilitar e preparar a recuperação, ela será rápida: 10 a 14 meses.

10 a 14 meses...

Sim, isso é rápido, é um tempo curto.



Imaginem, agora, a economia brasileira.
Que é gigantesca, embora miserável no que diz respeito à sua repartição e, mais ainda, à sua qualidade, à sua eficiência, à forma como ela é gerada, exceção feita ao setor agropecuário (que é o mais moderno, para não dizer o único, e é, igualmente, o único que é competitivo com qualquer outro similar no planeta... e leva vantagem)...


Essa economia, que chegou a ser da ordem de 2,5 trilhões de dólares, foi tratada com o lixo.
Foi saqueada.
Foi depauperada nas gestões (?) Lula e Rousseff.
Foi destruída, esse é o verbo correto.


Busca-se, agora, sua reconstrução.
Ela será muito lenta, muito longa, muito sofrida.
Apesar disso, as críticas ao governo de transição, pois é isso que é o governo Temer, se avolumam.


Curiosamente, mas não por coincidência, essas críticas nascem em grande parte entre os defensores das gestões saqueadoras, das gestões criminosas.
Roubaram... Saquearam... Destruíram...
E agora criticam a tentativa dolorosa de reconstrução.

A economia de uma nação é como o organismo de um cavalo atleta ou uma vaca de 25.000 litros de sangue trafegando por seu úbere: grande, sofisticada, complexa.

Reconstruir uma economia, infelizmente, demanda muito mais tempo, inteligência, dedicação e energia, trabalho, do que reconduzir um cavalo depauperado a uma excelente forma física. Ou fazer com que uma vaca retome sua produção original.


Detalhe: dependendo do nível de depauperamento, o cavalo ou a vaca jamais voltará ao seu nível original.

Bom, alonguei-me.

Leiam o editorial da Folha de S.Paulo, transcrito abaixo integralmente para permitir a leitura por quem não assina a Folha:



Jornada longa

Está apenas no começo a restauração da saúde financeira do Estado brasileiro, condição fundamental para o país ter juros civilizados de forma perene e crescimento econômico consistente.
Se confirmadas as projeções do governo, o deficit do setor público —somando União, Estados e municípios— terá sido próximo de R$ 167 bilhões (2,6% do PIB) em 2016. Essa conta não inclui os juros, que levam o rombo a 9,3% do PIB.
Desde iniciado o colapso da economia, em meados de 2014, a dívida pública subiu de 52% para 71% do PIB, um salto sem precedentes.
Nos planos do governo, considerando o teto de gastos, a aprovação da reforma da Previdência e a lenta retomada da arrecadação, o país zerará o deficit em 2019 ou 2020.
Até lá, a dívida terá chegado a cerca de 85% do PIB, o maior nível entre países emergentes. Para estabilizá-la nesse patamar, não bastará eliminar o rombo. Será necessário gerar um saldo positivo de ao menos 2,5% do PIB.
Ou seja, trata-se de obter uma virada de cerca de R$ 300 bilhões (5% do PIB) nos próximos anos.
Será impossível fazer isso apenas com cortes de despesas gerais de custeio. O país não pode mais prescindir de uma ampla reforma da Previdência, a maior despesa do Orçamento —cujo crescimento, se mantido intocado, logo esmagará todas as outras rubricas.
Parte do problema decorre da queda da arrecadação resultante da recessão. Desde o pico, em 2013, a coleta de impostos e contribuições caiu 10% (ajustada pela inflação), ou cerca de R$ 150 bilhões.
Quando a economia voltar a crescer, como se espera a partir deste ano, uma parte desse montante voltará aos cofres públicos. Mesmo assim, ainda faltará muito.
Será preciso reduzir desonerações inconsequentes e rever incentivos fiscais sem contrapartidas mensuráveis, dois itens essenciais numa campanha de combate aos predadores do Estado que tanto prosperaram na era petista.
Feito tudo isso, provavelmente será necessário considerar algum aumento de impostos. Esse debate ainda não começou, mas poderá ganhar corpo após a aprovação da reforma da Previdência, se a medida se mostrar importante para antecipar a estabilização da dívida.
Nesse caso, o aumento deverá se pautar por maior progressividade e justiça tributária, com simplificação e redução de impostos que oneram a produção e o consumo.
A destruição das contas públicas, por incompetência e rapinagem de quem esteve no poder na última década, atingiu proporções inacreditáveis. Arrumar a casa levará tempo e exigirá coragem e liderança raramente vistas no cenário político brasileiro.


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