sábado, janeiro 23, 2016

A Lua prateada, saudade da minha terra, saudade de Padre Nóbrega e dos tempos d’eu criança

A foto abaixo mostra o céu ocidental na madrugada desse sabadão, uns quarenta minutos antes do começo da ordenha da manhã.
Passava um pouco das cinco da manhã. Tinha acabado de fazer o primeiro café do dia e abri a cortina da janela da cozinha, que fica, justamente, voltada para o oeste ou, como diriam os anúncios de imóveis, tem face oeste.
E lá estava ela, a terra pisada por Neil Armstrong e mais alguns humanos, a Lua, em seu primeiro dia de cheia.
A Lua prateada da canção, clareando a estrada e o mundo.



A foto é pobre, sinto. Ela deveria mostrar a Lua emoldurada pelas árvores, um cenário bonito demais.
E quieto, sossegado, um pouco antes da passarada, fazendo alvorada, começar a cantar.

Depois veio o dia. Cheio, trabalhoso, cansativo.
Mudei a programação de corte do milho lá do Zé Fernandes de segunda pra terça. Hoje consegui o trator do novo vizinho, gente boa. Emprestou-me o Fordão com que, habitualmente, compactamos o milho picado no silo-trincheira.
Pra ganhar tempo, puxei pra amanhã a coleta e pesagem do leite de todas as vacas, individualmente, pra não atrasar os resultados e também para não sobrecarregar o meio da semana, quando a feitura do silo tomará todo nosso tempo fora das ordenhas e trato das vacas. Sobrou pro Dito. Amanhã vou busca-lo de madrugada. Enquanto eu fico na ordenha fazendo a coleta e a pesagem, ele cuidará dos bezerros.
Será mais um domingão como tantos outros, talvez com alguma chuva, já prevista para hoje.
Bom, nem sempre a previsão se realiza... Vamos ver.

Deixo para quem quiser ler, a letra de uma de minhas músicas mais queridas, especialmente nas vozes de Chitãozinho e Xororó: “Saudade de minha terra” – composição, verdadeiro poema, de Goiá e Belmonte.

“De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar

Adeus, paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão, eu quero voltar
Ver a madrugada, quando a passarada
Fazendo alvorada, começa a cantar
Com satisfação, arreio o burrão
Cortando estradão, saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
Sabiá cantando no jequitibá

Por Nossa Senhora,
Meu sertão querido
Vivo arrependido por ter te deixado
Esta nova vida aqui na cidade
De tanta saudade, eu tenho chorado
Aqui tem alguém, diz
Que me quer bem
Mas não me convém,
eu tenho pensado
eu fico com pena, mas esta morena
não sabe o sistema em que eu fui criado
Tô aqui cantando, de longe escutando
Alguém está chorando,
Com o rádio ligado

Que saudade imensa do
Campo e do mato
Do manso regato que
Corta as Campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Nas lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança
Daquelas festanças
Onde tinham danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem Ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas
mãos divinas

Pra minha mãezinha já telegrafei
E já me cansei de tanto sofrer
Nesta madrugada estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Já ouço sonhando o galo cantando
O nhambu piando no escurecer
A lua prateada clareando a estrada
A relva molhada desde o anoitecer
Eu preciso ir pra ver tudo ali
Foi lá que nasci, lá quero morrer.”

Ouço muito essa música, vira e mexe me ponho a cantarola-la, coisa em que sou um prodígio... De ruim.
E toda vez, toda vez, toda santa vez que escuto:
Nesta madrugada estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Toda vez minha memória voa pros tempos d’eu criança, saindo da casa dos meus pais com um tio ou amigo da família e indo pra Estação da Luz, onde, no final da madrugada, pegava o “trem de luxo” da Cia. Paulista de Estradas de Ferro (uma das ferrovias destruídas pelo governo burro de JK, trabalho continuado pelos governos cegos dos militares e dos que a eles se seguiram). Nunca viajei na primeira classe, só na segunda, que era uma maravilha. Mas bem que gostaria de uma vez só, uma vezinha só, ter viajado na primeirona...
Pra Marília, ou melhor, pra doce e querida Padre Nóbrega, onde o trem parava por um minuto ou dois, eram pouco mais de dez horas de viagem.
Pra Flórida Paulista, onde ficava a Fazenda Saudade, que meu avô administrava, eram catorze horas.
Catorze horas!
No mínimo umas três ou quatro eu passava na plataforma, vendo a paisagem, sonhando com a minha própria fazenda num dia futuro.
Memórias indeléveis. Mais que memórias, tudo isso é parte do meu DNA. Estou certo, nem preciso de teste para confirmar.


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