A chuva
chegou. Tarde, atrasada, em pleno dia 20 de outubro, mas chegou.
Depois de um
setembro atípico, com 125,0 mm até o dia 13, parou de chover. Para o resto do
mês já estava bom, afinal, outubro estava logo ali e com ele boas chuvas.
As previsões
e as esperanças não se concretizaram. Essa chuva, com muita pirotecnia e efeitos
sonoros assustadores, começou tão logo caiu a noite. Nesse momento,
completávamos 37 longos e tenebrosos dias sem uma gota de chuva aqui no sítio.
Novamente, não estaria tão ruim graças às chuvas de setembro, mas o calor foi
excessivo, absurdo, por toda parte. Há poucos dias, o Rio de Janeiro registrou
43,8 graus centígrados, o terceiro dia mais quente em 100 anos. Nesse mesmo
dia, tivemos aqui assustadores 40,0 graus.
Como tudo
que está ruim pode ficar ainda pior, os ventos dos últimos dias secaram tudo
que ainda restava de umidade nas camadas superiores do solo. Ventos secos,
quentes, provocando enorme desconforto, fisicamente depressores e
espiritualmente deprimentes.
Muitos
vizinhos plantaram milho para produzir silagem logo no início do mês, alguns,
corajosos, até no final de setembro. As previsões dos institutos prometiam
chuvas dentro dos primeiros dez dias do mês. Não vieram.
O milho nasceu bonito,
vistoso e encheu a todos de esperança.
Sem chuvas e com as altas temperaturas, a
lavoura começou a sentir.
Pelas manhãs, nas primeiras horas de cada dia, as
pequenas plantas estavam viçosas, as folhas brilhando ao Sol. Já no meio do
dia, porém, o cenário mudava e ao começar a tarde, o viço já estava perdido e
as plantas murchavam.
No dia seguinte, porém, novamente amanheciam bonitas,
novamente davam esperança, para logo depois definharem.
Enquanto as plantas se
recuperam, a lavoura está viva e é viável, mas, chega um momento em que elas
amanhecem murchas.
É o triste sinal de que a lavoura está morta, não tem mais
salvação, um novo plantio precisa ser feito.
Novas despesas, grandes prejuízos.
Vivemos
nosso drama aqui no sítio na mesma linha.
Os piquetes de capins Mombaça e
Tanzânia começaram a crescer com as chuvas de setembro. Já sem comida, tomei a
decisão de soltar as vacas nos piquetes, economizando dinheiro e,
principalmente, economizando feno.
Porque, finalmente, o feno de nosso
fornecedor acabara.
Porque também lá o capim que era para ser fenado...
acabara.
As vacas
entraram em piquetes com um terço ou menos da altura ideal para pastejo. Para
aumentar a oferta de comida, abrimos dois piquetes por noite ao invés de um.
Assim se
passarem cerca de 10 dias, quando novamente bateu o desespero da falta de
comida e a corrida ao feno.
À espera
dessas chuvas fiz uma loucura necessária, loucura financeira, bem entendido, e
comprei adubos. Desde ontem (agora anteontem) estamos adubando os piquetes,
confiantes que com alguma sorte choveria amanhã, que já é hoje, e depois de
amanhã, ou simplesmente amanhã.
A chuva
nos surpreendeu agradavelmente e chegou hoje, na verdade ontem, como vocês
entenderão logo mais.
Durante a
noite a luz piscou uma, duas, três vezes, e já num horário bem adiantado as
piscadas se somaram aos relâmpagos cada vez mais fortes e com menor intervalo
entre um e outro.
Parecia claro, tinha toda a pinta que a luz cairia de vez.
Coloquei
uma camiseta já usada, calção, uma blusa sobre a camiseta apesar do calor (para
prevenir nova safra de dores dos músculos próximos aos pulmões) e calcei a bota
de cano longo, sem meia, só de calção.
Chique.
Jeito de modelo, mas não me
convidem para o ridículo desfile com o pessoal se trocando em frente ao
público. Tô fora.
Fui para o
barracão da ordenha para desligar o tanque de refrigeração na tomada, mas a
temperatura do leite estava alta, com 4,7 graus, próximo de iniciar um novo
ciclo de resfriamento até levar o leite a 2,9 graus.
Cocei a
cabeça, pensei e liguei o tanque no manual – agitador e refrigerador. Para
passar o tempo fui ver o pluviômetro e as vacas.
O
pluviômetro só não foi decepcionante porque já esperava mesmo pouco volume de
água – apenas 2,5 mm. Joguei fora essa água e deixei-o zerado. Barulho demais,
chuva de menos. Vamos ver amanhã.
O lote das
Jersey estava na pista de alimentação, sob o abrigo do teto. No cocho mais
nada, já tinham comido todo o feno.
Os olhares compridos e pidões me deixaram com dó e passei alguns minutos
desfiando e colocando mais feno, ao qual se atiraram com uma vontade que, para
vacas leiteiras, pode ser chamada de voracidade.
Ao voltar
para o barracão a temperatura do leite já estava em 0,9 grau e um pouco mais ia
virar picolé de leite. Desliguei tudo, retirei o conector da tomada trifásica e
voltei pra casa.
Molhado e
suado ou molhado e molhado. Depois de me enxugar e recolocar a bermuda e
camiseta de dormir, liguei o notebook e comecei a escrever.
O dia 21 de
outubro já começara há algum tempo.
Há algum
tempo eu já estava um ano mais velho.
Entrei em
meu 61º aniversário embaixo de chuva, ventos e relâmpagos, desligando tanque e dando feno para as vacas.
A chuva foi
meu presente. Um presentão muito bem-vindo.
Agora só
falta o sono chegar. Deve estar perdido lá pra cima, no meio do pasto.
Coisa rara
em minha vida, fui à geladeira peguei uma Bud estupidamente gelada e bebi. Na garrafa.
Gostosamente. Ainda tem um restinho, ainda bem gelado e acho que antes desse
restinho acabar o sono vai aparecer para tomar um golinho.
Aí eu pego ele. E levo
pra cama.
Tarde do dia 21 – com toda a pirotecnia que avançou
madrugada adentro, com todo o exagero celeste dos efeitos sonoros, tivemos só
mais 2,5 mm de chuva. Totalizou 5,0.
Tá bom.
Tem promessa de mais para esses
dias.
E hoje o resto dos piquetes foi adubado. Agora, é esperar pelo capim.
Junto
com o Kindle que a Rosa me deu hoje cedo, essa chuvinha de cinco milímetros foi
meu melhor presente.
Tá bom. Tô bem de presentes. Que continue assim.
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