Vida na roça entre
choques e suavidade
Sexta-feira, quase uma da tarde, acabáramos de almoçar.
Atrasado, dedilhava um texto pro OCE no notebook, caneca com café cheiroso e
fumegante ao lado. Em outra era, estaria batucando e comandando o matraqueado
metálico de uma parruda Remington, maço de folhas em branco ao lado do café e
do cigarro, esse também fumegante, mas nada cheiroso.
Clichê, já que nunca fui fumante, mas, vai saber, né?
Entretido com tanta coisa e escrevendo sobre dinheiro,
dívidas, gestão e confusão no futebol, tomei um baita susto com o estouro.
Forte, seco, daqueles barulhos redondos.
Com ele caiu a luz.
Treinado e pronto, levantei-me com o celular na mão
procurando o fone de emergência da fornecedora de eletricidade. Enquanto
passava pelo interminável “atendimento” automático, orientei o Zé a desligar o
tanque de refrigeração do leite da tomada. Prevenir para não ter que remediar.
Empresa comunicada, começou a espera, como sempre chata e
plena de ansiedade, pela viatura com os profissionais e seus equipamentos.
Demorou. Pouco depois das três da tarde chegaram. Fomos para
o poste com as chaves, logo antes do transformador. Vasculhando o chão
descobrimos o autor, melhor dizendo, o causador do estouro e da falta de luz:
um pica-pau. No chão, morto mortinho esturricado, embora sem aparência de
torresmo.
O choque foi fortíssimo, tão forte que ele nem percebeu que
já morreu e deve estar, ainda, sobre um fio e tentando pegar um inseto no outro
fio com o bico. Ao pegá-lo, fechou a corrente, gerou o curto-circuito, foi
torrado e deixou-nos sem força para manter o leite gelado, funcionar a
picadeira de cana, começar a ordenha das vacas, além, é claro, de deixar-me sem
internet e com as geladeiras e freezers desligados.
Toda a vizinhança que usa a mesma rede também foi afetada.
Ao contrário de outras vezes, a queda na corrente aqui em casa desligou o
fornecimento em vários vizinhos. E todos ligaram para a empresa reclamando,
como tem que ser. Funcionou.
Ao fim e ao cabo salvaram-se todos, exceto o pica-pau,
bonito e simpático, mas azarado, e a rotina das vacas, atrasada em quase uma
hora.
De quebra, o pessoal da empresa disse-me que em breve
trocarão os cabos expostos por outros protegidos, o que impedirá esse tipo de
acidente e a morte de maritacas (useiras e vezeiras, inclusive aqui mesmo),
pica-paus e outras aves.
Meno male.
Hoje cedo, o sábado começando, fui buscar o Dito em sua
casa, em Santa Cruz da Estrela ou, simplesmente, Estrela. No caminho, nas
primeiras luzes do dia, a paisagem bonita de um amanhecer na roça.
Não resisti e parei o carro para olhar meio minuto.
E mais meio minuto para algumas fotos, afinal, para que ter
um smartphone com câmera se não for para usar?
Fim. Até porque, antes de postar isso, vou preparar o café
da tarde. Depois, mais dez minutos de computador e aí é levantar de novo e ir
pra lida lá fora, começando o trato das bezerras.
Fui.
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