Madrugada molhada,
trabalhosa, cansativa
Duas e meia da manhã. Camiseta seca sobre o corpo úmido de
suor. Não vou tomar outro banho, minutos depois de ter saído do chuveiro. Horário
estranho, não?
Pois é. Culpa de chuva extemporânea e, pior, mal prevista
pelo serviço meteorológico, como de hábito.
Depois de um domingo extenuante tomado por trabalho braçal
pesado, caí na cama pouco depois das nove da noite. Quando o sono parecia
engrenar a segunda, despertei com a chuva chegando. Que coisa mais irritante! Afinal,
no início da noite a Lua estava bonita e, apesar de algumas nuvens, não tinha
cara de chuva. Chuva meio miúda, fiquei quieto. Dormi. Acordei às onze, pois a miúda
engrossou. Passou a chover pesado. Adeus sono.
Nessa época do ano em que a seca (seca?), o frio e o menor
tempo de luz paralisam o crescimento dos capins tropicais, a salvação do
rebanho para quem não tem e$trutura para fazer silagem é cortar cana, picá-la,
acrescentar ureia e fornecê-la para o gado. O problema é que a ureia pode matar
uma ou mais vacas em caso de chuva sobre a cana. A água vai lavar a ureia da cana e acumular-se no
cocho, formando uma sopa mortífera. O
ideal, naturalmente, é fornecer a cana picada em cochos cobertos que não recebam
chuvas, o que é fácil de preconizar e difícil de praticar. Aqui no sítio a
maioria das vacas comem em um grande cocho em U, coberto. Ou melhor, descoberto
desde julho do ano passado, quando um vendaval destruiu o teto completamente. Ainda
não consegui recobri-lo, o que espero fazer nos próximos 60 dias. Enquanto isso,
em caso de chuva o jeito é correr e tirar a cana porventura ainda existente,
juntamente com a água.
Ué, não tem ralo?
Pois é... Ter, tem, mas não
funciona, porque o sujeito que o construiu, autointitulado mestre de obras,
simplesmente ignorava leis básicas da natureza e o ralo se situa num nível mais
alto que o piso do cocho. Esse, por sinal, é um problema extremamente sério. Ainda
não conheci pedreiro ou mestre de obras que faça pisos nivelados corretamente. Dizem
que existem, mas sou meio cético. Só acreditarei vendo.
Por volta de uma e pouco a chuva
amainou. Saí, agasalhado devidamente, lanterna na mão, boné na cabeça, e fui lá
pra cima. Mais uma madrugada de trabalho inglório e parciamente infrutífero, no
escuro, embaixo de chuva miúda que em certo momento parou (e agora voltou,
escuto). E tome trabalho braçal.
Sem chuva, fiquei encharcado. De suor.
Tanto que, serviço meio concluído, entrei e tomei a tal ducha. No meio da dita
lembrei-me que não tinha ido olhar os cochos das “goiabeiras”. São de madeira,
empoçam pouca água, mas...
Lá fui eu de volta para a
madrugada úmida do Macaúbas. Parênteses: bota de borracha de cano alto: sem ela
não haveria como existir vida na roça. A minha é dinamarquesa, chique, boa,
confortável e carésima. Mas não comprei, ganhei. Bem na hora, pois as vacas já
estavam voltando para comer o resto da cana e em um dos cochos tinha água
empoçada. Mais trabalho. Para não deixar as moças frustradas, abri um piquete
ao lado com um arremedo de capim, mas o bastante para elas se atirarem a ele sofregamente.
Vaca adora capim, não há nada melhor, nada que se compare.
Agora, tentando fazer o sono
chegar, fico aqui escrevendo, pois estou sem paciência para ler sobre a “primavera
tupiniquim”.
Talvez ainda vire uma primavera
política de fato, mas tenho dúvidas. Tem muita gente instrumentalizando, tem
muita gente aproveitando para bagunçar, mas o sentimento difuso de oposição a “tudo
que está aí” é forte. O saco anda cheio e não é só o de quem depende de
transporte público.
Não demora muito o dia vai chegar
e o meu sono não. Já vi esse filme antes.
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