Cavalos são uma das mais belas e fantásticas criaturas que a Natureza criou.
Poucos seres humanos dão-se conta de sua importância para sermos o que somos hoje.
Ao domesticarmos o cavalo – domesticar: verbo tenebroso durante séculos, que hoje começa a ter seu significado transformado – ou, também posso dizer, a partir do momento em que aprendemos a conviver com essa criatura, nossa velocidade de deslocamento foi multiplicada.
O comércio beneficiou-se, a troca de ideias, o abastecimento de comida, tanto pela caça como pela troca e a produção, o ir e vir de pessoas, muitas outras atividades foram intensificadas graças ao emprego dos cavalos.
Sim, sem dúvida também as atividades bélicas.
Conhecendo o ser humano, o mais provável é que o primeiro e mais importante uso do cavalo foi nas guerras, pequenas, localizadas, entre tribos, mas sempre guerras.
A humanidade, tal como a conhecemos hoje, tem uma enorme dívida com os cavalos, que não é paga, nunca foi, de maneira digna, outro traço infeliz muito comum ao Homo sapiens.
A notícia trazida pela Folha chocou-me nesse final de madrugada: a morte de oito cavalos num haras de Itaipava, seguidas pelo sacrifício de outros oito.
Mais trágica ainda se torna a notícia quando ela relata que o tratador dos animais, chamado Miguel, não quis fugir da fúria das águas e ficou com seus animais. Não de sua propriedade material, mas de sua propriedade sentimental, infinitamente mais nobre e importante.
Lamento pelo Miguel, lamento pelos cavalos, independentemente de serem bonitos e valiosos, o que, em se tratando de vida, é irrelevante.
Lamento, profunda e sinceramente, pelas centenas de pessoas que morreram nessa tragédia anunciada, nessa tragédia reprisada, nessa tragédia que qualquer pessoa com um mínimo de bom senso e capacidade de observação sabia que iria acontecer e, pior, muito pior, sabe que irá acontecer novamente.
Não é a primeira vez que escrevo essa obviedade e não será a última, lamentavelmente.
O ser humano, com sua arrogância e sua ignorância, teima em desafiar a natureza e a resposta sempre se dá em forma de tragédias.
Meu respeito, minha admiração, minha dor pelo Miguel, a quem dedico esse texto.
(Abaixo, a transcrição da notícia da Folha de S.Paulo)
São Paulo, sexta-feira, 14 de janeiro de 2011 |
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2 comentários:
Tragédia "reprisada", muito bem colocado.
Lindo seu texto, linda a atitude do Miguel!
Não só cavalos de haras sofreram, veja: http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/chuvas-no-rj/noticia/2011/01/imagem-mostra-cavalo-preso-em-escombros-de-casa-em-itaipava.html
E os cães, gatos, aves...
Reprisa, reprisa e reprisa a lição e não aprendemos a dimensão dos estragos que causamos...
Me comovi com esta história de amizade e lealdade. Sua homenagem foi brilhante.
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