quarta-feira, julho 28, 2010

O Sol e a Lua e o frio do final da madrugada

Essas últimas manhãs ou, mais precisamente, finais de madrugada, têm sido preciosos. O frio é quase forte, gostoso sem ser cortante, exigindo camiseta, camisa e blusa. Antes das nove horas, só restou a camiseta. As colinas a oriente são delineadas pelo brilho do Sol, ainda invisível, mas a ocidente a Lua cheia brilha soberana, intensa, prateada, bonita de ver, e por mais que a gente veja não dá cansaço.

Quando o Sol finalmente aparece, ela, a rainha dessas noites de claridade intensa e sombras fortes, continua brilhante. Enquanto vou trabalhando sempre consigo alguns segundos para olhar ao redor. As galinhas estão descendo das árvores onde passaram a noite, algumas mais ativas e outras, definitivamente, boas vidas, sossegadas, para não dizer preguiçosas. No alto do barbatimão as angolas ficam batendo papo. Impossível sequer imaginar o que tanto conversam. As vacas que entram mais tarde para a ordenha ficam deitadas. A cada respirada, o ar exalado forma uma nuvem de vapor. O touro dorme profundamente, a cabeça aninhada de encontro às pernas dobradas junto ao peito. Lobos e tigres-dente-de-sabre são lembranças perdidas somente no código genético. Claro, tem toda a passarinhada começando a se assanhar. Melhor dizer toda a bicharada de pena, pois além dos muitos passarinhos – como os canarinhos-da-terra que vêm num grande bando comer a quirera que as galinhas deixam – tem as garças-brancas-pequenas, a família de seriemas – cada vez mais folgadas, íntimas e atrevidas, o suficiente para pegarem ovos num ninho no meio de um piquete a poucos metros de onde eu colocava o trato da tarde nos cochos – e um grande bando de barulhentas curicacas, que passam horas no meio dos pastos.

Há momentos durante o dia que falar ao telefone é tarefa ingrata, pois é comum vários galos cantarem ao mesmo tempo, fazendo uma algazarra ainda maior com os “to fraco tô fraco tô fraco” das angolas. Nas pausas, o canto dos passarinhos toma conta.

Viver na cidade é bom, inegavelmente, por tudo (de bom) que a cidade oferece. Mas nunca me enganei, nunca tive a menor dúvida: viver no campo é incomparavelmente melhor.

terça-feira, julho 06, 2010

Enquanto isso, na roça...

Um de meus vizinhos comprou sua propriedade há muitos anos. Era, então, terra de cana, meio devastada. A lavoura encostava nas margens dos dois pequenos córregos que fazem parte das divisas da propriedade. Vegetação ciliar, mata ou não, era quase um mito.

Cuidaram da terra e plantaram laranja. Também plantaram árvores em muitos lugares. E as laranjeiras ficaram longe, para os padrões da época, das margens, coisa aí de pouco mais de 30 metros.

Ontem cedo, pouco antes de eu chegar para pegar milho, o pessoal da Polícia Ambiental chegou e aplicou-lhes uma multa de R$ 1.500,00. Motivo: três pés de laranja estão dentro do limite legal de 30 metros que devem ser ocupados por matas ciliares.

É o caso de rir para não fazer besteira.

O novo Código Florestal está em vias de ser aprovado. Apesar de alguns exageros, espero que isso aconteça, pois, caso contrário, estarei na ilegalidade. Eu e quase todo produtor rural desse país. De acordo com os desejos dos povos das cidades, que gostam de comer e beber à tripa forra sem nada saber sobre seus comes & bebes, toda propriedade em diversas regiões brasileiras deve manter um mínimo de 20% de sua área como reserva. Ora, isso é aplicável, mesmo assim a duras penas, em áreas de colonização nova. Onde a agricultura é praticada a cem, duzentos, trezentos anos, pretender tal coisa é absoluta sandice.

Apesar da gritaria dos comedores e bebedores urbanos, o deputado Aldo Rebelo (nunca pensei que viesse a escrever isso) teve a visão e o bom senso de deixar fora desse texto urbanoide as propriedades onde tal situação já é antiga.

Se assim não fosse, eu teria que pegar 20% de minha área, já por si minúscula, e deixar o mato tomar conta. Ou, pior ainda, comprar mudas florestais e plantá-las, numa atividade cuja renda não permite o pagamento de um mísero plano de saúde.

Os povos urbanos nada conhecem da realidade que faz suas vidas confortáveis e suas barrigas imensas, mas adoram, desculpem a expressão, cagar regras sobre ela.

E enquanto isso, no maravilhoso mundo da roça...

Dias atrás, uma bela, aliás, belíssima fazenda da nossa região foi vendida. Cada um de seus quarenta alqueires (área de respeito para o estado de São Paulo) custou a seu novo e felicíssimo proprietário a bagatela de setenta mil reais. Preço baixo, sem dúvida, pelo que é contém a fazenda.

O total da operação ficou em 2,8 milhões de reais, pagos à vista.

E daí? – deve estar se perguntando o leitor impaciente com essa lenga-lenga.

Daí, estimado e pobre leitor, que como eu não deve ter condições de bancar tal compra, é que o comprador da fazenda em questão é figura de notória importância no mundo da política de Pindorama, grande e atrasado país localizado em sua maior parte, ao sul do Equador. Oriundo do que em Pindorama se chama classe média, esse personagem teve o dom fantástico de, ao mesmo tempo, crescer na política e amealhar patrimônio grande o bastante para dar-se a tal luxo, o de comprar uma fazenda para transformá-la em haras. Que beleza. Nessa hora, seu heroi e guia político e intelectual, o velho Leon, deve estar maluco de raiva, se revirando em sua tumba, ao ver tão promissor discípulo tornar-se tão... tão... tão competente, vá.

Em tempo: o sobrenome desse mítico Leon é Trotsky.